sábado, 17 de setembro de 2016

TST: DECISÃO QUE SE FUNDAMENTA NA CARTA DO JOÃO SEM TERRA - DISCRIMINAÇÃO DO MPREGADO MOVEU AÇÃO TRABALHISTA

Este acórdão do TST que com base na "CARTA DO JOÃO SEM TERRA" de 1215, na Inglaterra,  foi objeto de destaque, por ser um dos dois únicos acórdãos da C.Corte que até 2015, que nela se havia fundamentado, para refutar discriminação contra empregado que havia movido ação em face do seu empregador.

Esta decisão foi objeto de destaque por ocasião do aniversário de 800 anos da referida Carta e o seu teor foi exposto no memorial do TST.

Só prá lembrar.

José A. Pancotti


A C Ó R D Ã O
4ª Turma
JCJP/SJ/JP/mmr                   

RECURSO DE REVISTA. DISCRIMINAÇÃO. EMPREGADO QUE MOVE AÇÃO EM FACE DA  EMPRESA. AFRONTA A DIREITOS E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS QUE CONSAGRAM GARANTIAS FUNDAMENTAIS. CARACTERIZAÇÃO (CF/88, ARTS. 5º, CAPUT, INCISO XXXV, XLI; 7º, INCISO XXXII).  Afronta direito subjetivo público do cidadão trabalhador, arrolado entre os direitos e garantias fundamentais (Título II, Capítulo, I, art. 5º, XXXV, da CF/88), a alínea “d” do item 6, da decisão SEREC/DIRET.0840/94 da PETROBRÁS que cria “prêmio de incentivo à aposentadoria”, mas institui ressalva, excluindo o empregado que tiver movido ação trabalhista contra a empresa.  Esta ressalva fere de morte o princípio constitucional da igualdade, porque exclui o empregado que exerceu o direito de ação, além de constituir ameaça àqueles que vierem a exercê-lo,  revelando-se discriminação atentatória aos direitos e às liberdades fundamentais (CF/88, art. 5º, XLI). O ato patronal cria, portanto, discriminação entre seus funcionários, não tolerada porque afronta literalmente princípios constitucionais, como o da igualdade, da liberdade, do direito de ação e defesa e da segurança jurídica (CF/88, caput do art. 5º e art. 7º, XXXII). O princípio da igualdade, que está sempre associada ao ideal de justiça, repele a idéia de discriminação e consagra o ideal de que todos os cidadãos têm direito de tratamento igual perante a lei, em consonância com os critérios albergados pelo ordenamento jurídico (Alexandre de Morais, Constituição do Brasil Interpretada, 2ª ed.¸ 2003, p.180). O espectro do ordenamento constitucional veda as diferenciações desarrazoadas, arbitrárias, inaceitáveis e injustificáveis, porque redunda em discriminações, quando se dá um tratamento desigual, para casos iguais, revelando a negação do ideal de justiça. Não se cogita, in casu, como seria salutar, de “tratamento desigual dos casos desiguais, à medida que se igualam, como do  exigência do próprio conceito de Justiça”, pois o único critério adotado pela empresa é dar tratamento desigual a situações idênticas. O elemento discriminador, no caso em exame, por ser flagrantemente contrário a princípios constitucionais e direitos fundamentais, não pode ser aceito como legítimo. Recurso de revista conhecido e provido. TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. JORNADA. FLEXIBILIZAÇÃO. “A Constituição da República, ao disciplinar o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, fixa jornada de seis horas e permite transigência. A referência à negociação coletiva exclui a possibilidade de a sentença fixar jornada diversa daquela prevista no art. 7º, inciso XIV, da Constituição da República, porquanto a negociação pressupõe entendimento entre os atores da relação trabalhista enquanto a sentença normativa resulta, exatamente, da negociação frustrada a justificar a interferência da Justiça do Trabalho, que, ao invés de traduzir um acordo, impõe normas e condições de trabalho” (TST-ERR-515925/98, SDI-I, Rel. Min. João Batista Brito Pereira, DJU de 28.9.2001). Recurso de revista parcialmente conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Recurso de Revista nº TST-RR-541014/99.4, em que é Recorrente ANTONIO INACIO QUESADO e  Recorrida PETRÓLEO BRASILEIRO S.A.

O Eg. TRT da 5ª Região, por meio do v. acórdão de fls. 462/463, complementado às fls. 480, negou provimento ao recurso ordinário do reclamante.
Inconformado, o reclamante recorre de revista às fls. 483/501.  Aduz nulidade da decisão, que, não obstante a oposição de embargos declaratórios, permaneceu omissa quanto ao incentivo à aposentadoria. Aponta violação do art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, além de trazer arestos para confronto de divergência. Insurge-se contra a decisão quanto a “turnos ininterruptos de revezamento – jornada - flexibilização”, apontando violação do art. 7º, XIV, da CF e trazendo arestos para confronto.
Admitido à fl. 503, o recurso de revista recebeu contra-razões às fls. 504/508.
Os autos não foram remetidos ao Ministério Público do Trabalho.
É o relatório.

V O T O

O recurso de revista é tempestivo (fls. 481 e 483) e está subscrito por advogada devidamente habilitada nos autos (fls. 06/07).

I - CONHECIMENTO

I.1 – NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

O reclamante argúi nulidade da decisão do Eg. TRT de origem, alegando que, não obstante a oposição de embargos declaratórios, esta permaneceu omissa quanto ao incentivo à aposentadoria. Aponta violação do art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, além de trazer arestos para confronto de divergência.
O v. acórdão regional dirimiu a controvérsia, nos seguintes termos (fl. 463): “PRÊMIO INCENTIVO À APOSENTADORIA. Correta a Decisão. Em se tratando de liberalidade empresarial, a reclamada está livre para estabelecer os pressupostos e requisitos para o deferimento do prêmio incentivo à aposentadoria, desde quando não contrariem as disposições legais e não anotem procedimento discriminatório, o que não restou demonstrado nos autos, a contrário do alegado pelo recorrente”.
Sem razão o reclamante.
Conforme se depreende da transcrição acima, a matéria foi devidamente enfrentada pelo Eg. Tribunal Regional, explicitando claramente ser a reclamada livre para estabelecer os pressupostos e requisitos para o deferimento do prêmio de incentivo à aposentadoria, logo não estava obrigado o Juiz a deter-se sobre o referido instituto da coisa julgada. Assim, não se vislumbra a omissão apontada pelo reclamante no decisum recorrido.
Por outro lado, não há como conhecer da preliminar de nulidade por negativa de prestação jurisdicional com fundamento no dissenso de teses e pelo dispositivo constitucional apontado como afrontado (art. 5º, inciso XXXV), nos termos da Orientação Jurisprudencial nº 115 da Eg. SDI-I e segundo a diretriz traçada pela jurisprudência do excelso Supremo Tribunal Federal, no sentido de que, em causas de natureza trabalhista, às alegações de desrespeito aos postulados da legalidade, do acesso ao Judiciário e outros previstos no art. 5º da Constituição Federal, podem configurar, quando muito, situações de ofensa meramente reflexa da Lei Maior, circunstância que impede o manejo de recurso de natureza extraordinária (ver AG-165.054-SP, Rel. Ministro Celso de Mello; AG-188.762-PR, Rel. Min. Sydney Sanches; RE-236.333-DF, Rel. Min. Marco Aurélio.)
NÃO CONHEÇO.

I.2 – PRÊMIO INCENTIVO À APOSENTADORIA

O  acórdão regional enfrentou tal pretensão do autor, vazando a decisão nos seguintes termos (fl. 463):

PRÊMIO INCENTIVO À APOSENTORIA. Correta a Decisão. Em se tratando de liberalidade empresarial, a reclamada está livre para estabelecer os pressupostos e requisitos para deferimento do prêmio incentivo à aposentadoria, desde quando não contrariem as disposições legais e não anotem procedimento discriminatório, o que não restou demonstrado, a contrário do que alegado pelo recorrente.
Conforme item 6, letra “d” do SEREC/DIRET 80.0840/94 (vide fls.173/175), uma das diretrizes básicas para a implantação do referido programa é, justamente, não permitir a participação de empregado que mantenha ação trabalhista contra a mesma companhia, caso “sub-judice”.

O reclamante, no seu recurso de revista, sustenta que está sendo vítima de procedimento discriminatório pela ré, pois outros colegas que receberam o referido prêmio se encontravam em nas mesmas condiçções que o autor. A sua exclusão da percepção da vantagem se deu tão-somente por ter movido ação trabalhista contra a ré. Sustenta violação ao art. 5º, caput e XXXV, art. 7º, XXXII, art. 37, caput, todos da Constituição Federal de 1988. Colaciona os arestos de fls.494/495 para confronto.
Com razão o autor.
O fundamento com que o acórdão regional refutou a pretensão do autor ao pagamento de “prêmio de incentivo à aposentadoria”, consagra uma arbitrária e brutal discriminação do cidadão trabalhador, na medida que legitimou ato patronal que cria um benefício que pode alcançar todos os seus funcionários que se preencham certos requisitos, porém, coloca uma ressalva, se tiver movido ação contra a empresa, será excluído da premiação, ainda que satisfaça os demais requisitos. Tal ressalva fere de morte um dos direitos fundamentais garantidos pela Constituição (CF/88,Título II, Capitulo, I, art. 5º, XXXV), qual seja, o exercício inalienável do direito de ação, como forma de obter do Estado um provimento jurisdicional, acerca de um litígio, em face do seu empregador.
O direito de ação é assegurado pelo art. 5º, XXXV (a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça a direito), Título II, da CF/88,(DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS). Trata-se de um dos direitos fundamentais de primeira geração, consistente à liberdade da pessoa humana que não pode sofrer qualquer restrição de exercício pelo Estado, nem por particulares, seja pessoa física ou jurídica.
A história dos direitos humanos registra que as garantias constitucionais da ação e do processo têm origem no art. 39 da Magna Carta, outorgada em 1215, por João Sem-Terra a seus barões, em que se preconizava que Nenhum homem livre será preso ou privado de sua propriedade, de sua liberdade ou de seus hábitos, declarado fora da lei ou exilado ou de qualquer forma destruído, nem o castigaremos nem mandaremos forças contra ele, salvo julgamento legal feito por seu pares ou pela lei do país. Segue-se, entre tantos instrumentos do direito internacional, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, da ONU, 1948, estatuiu: Toda pessoa tem direito, em condições de plena liberdade, ser ouvida publicamente e com equidade e justiça por um tribunal independente e imparcial (...).
Assim, o direito de ação é garantia milenar do cidadão, sendo enfatizada, entre os povos civilizados, como a característica fundamental do moderno Estado Democrático de Direito que vem se consolidando durante o transcurso dos séculos XIX E XX.
Trata-se, portanto, de garantia qualificada entre os direitos fundamentais do cidadão, na CF/88. Os direitos fundamentais se caracterizam exatamente por serem irrenunciáveis, inalienáveis, intransferíveis, imprescritíveis e não patrimoniais (José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, 9ª, ed., 1994. p. 162-163.)
O Poder Judiciário e o esforço para possibilitar ao cidadão a mais ampla garantia de acesso á justiça são igualmente marcas essenciais do Estado Democrático de Direito. É inadmissível, “data venia”, que se dê validade de uma manifestação de vontade patronal de tão elevado grau discriminação.
Como oportunamente apontado pelo recorrente o ato patronal se tipifica igualmente como atitude de flagrante discriminação dentro do quadro de seus servidores, afrontando literalmente o caput do art. 5º da Constituição Federal de 1988 (Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País à inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:)
O princípio constitucional da igualdade que não convive com qualquer forma de diferenciações entre pessoas que sejam desarrazoadas, arbitrárias, inaceitáveis e injustificáveis, porque redunda em discriminações, pois, por medida de justiça não se permite dar um tratamento desigual, para casos iguais, isto porque “se a justiça se relaciona com a igualdade e a igualdade repele discriminação, a discriminação é também uma negação da justiça”. (Estevam Mallet, Direito do Trabalho e discriminação, Revista Amatra, II, dezembro/2003, p.18-19). Não se vislumbra mera diferenciação tolerável entre pessoas, pelo critério da natureza da atividade profissional desenvolvida ou em razão do contexto de sua execução do trabalho, como talvez possa ter entendido o Eg. Regional, na medida que o direito do trabalho não convive com qualquer tipo de discriminação, quer no seu conceito genérico do art. 5º caput, quer especificamente no art. 7º, XXXII da CF/88.
Destarte, afronta direito subjetivo público do cidadão trabalhador, arrolado entre os direitos e garantias fundamentais (Título II, Capítulo, I, art. Art. 5º, XXXV, da CF/88), a alínea “d” do item 6, da decisão SEREC/DIRET.0840/94 da PETROBRÁS que cria “prêmio de incentivo à aposentadoria”, mas institui ressalva, excluindo o empregado que tiver movido ação trabalhista contra a empresa.  Esta ressalva fere de morte o princípio constitucional da igualdade, porque exclui o empregado que exerceu o direito de ação, além de constituir ameaçar àqueles que vierem a exercê-lo,  revelando-se discriminação atentatória aos direitos e às liberdade fundamentais (CF/88, art.5º, XLI). O ato patronal cria, portanto, odiosa discriminação entre seus funcionários, não tolerada porque afrontando literalmente princípios constitucionais, como o da igualdade, da liberdade, do direito de ação e defesa e da segurança jurídica (CF/88, caput do art. 5º e art. 7º, XXXII). O princípio da igualdade que está sempre associada ao ideal de justiça, repele a idéia de discriminação e consagra o ideal de que todos os cidadãos têm direito de tratamento igual perante a lei, em consonância com os critérios albergados pelo ordenamento jurídico (Alexandre de Morais, Constituição do Brasil Interpretada, 2ª ed.¸ 2003, p.180). O espectro do ordenamento constitucional veda as diferenciações desarrazoadas, arbitrárias, inaceitáveis e injustificáveis, porque redunda em discriminações absurdas, quando se dá um tratamento desigual, para casos iguais, revelando a negação do ideal de justiça justiça. Não se cogita, in casu, como seria salutar, de “tratamento desigual dos casos desiguais, à medida que se igualam, como do  exigência do próprio conceito de Justiça”, pois o único critério adotado pela empresa, é dar tratamento desigual a situações idênticas. O elemento discriminador, no caso em exame, por ser flagrantemente contrário a todos os princípios constitucionais e direitos fundamentais, não pode ser aceito como legítimo.
O campo da discriminação no direito trabalho, no Brasil, como se pode ver, a hipótese em exame, não se restringe aos casos de discriminação fundada em sexo, cor, idade, estado civil, religiosa e outras circunstância, como o ter origem em determinada região ou Estado da Federação ou dentro de uma região do próprio Estado (nordestinos, “caiçaras”- SP), mas alcança também o fato de ter o trabalhador exercido o direito de reclamar a reparação de direitos, na Justiça do Trabalho. Aliás, a utilização, por alguns empregadores das chamadas “listas negras”, rol de trabalhadores que já reclamaram ou têm reclamação na Justiça do Trabalho, bem como a exigência de prova de inexistência de ações trabalhista, como forma de discriminar trabalhadores, no ato da admissão. A instituição de vantagem contratual para todos os empregados, por ato unilateral da empresa, excluindo os trabalhadores que têm reclamação trabalhista contra si, não foge à caracterização igualmente de ato discriminatório arbitrário e absurdo e insuportável, porque fere um dos princípios basilares do Estado Democrático de Direito: pedir ao Judiciário provimento acerca de um litígio.
No caso, não bastasse ter o recorrente apontado a afronta ao princípio constitucional genérico da igualdade, invocou, ainda, o princípio da proibição de discriminação específico, dentre os direitos sociais (CF/88, art. 7º, XXXII), enfatizando que não se conforma com a discriminação  entre trabalhadores que se encontrem em igualdade de condições para auferir uma vantagem concedida pelo empregador.
O último aresto de fls. 495 veicula tese que se contrapõe frontalmente àquela veiculada pelo acórdão regional, quando argumenta que “É certo que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, e esta garante a igualdade de tratamento entre os empregados. Na hipótese, a empresa instituiu um prêmio para quem aderisse ao PDV e o pagamento do benefício a alguns empregados em detrimento do Reclamante, o que ensejou a desigualdade que foi corrigida pela decisão judicial”.
Por tais fundamentos, CONHEÇO o recurso de revista por afronta ao princípio constitucional da igualdade (art. 5º, caput), ao direito de ação e de defesa (art. 5º, XXXV), além da divergência jurisprudencial pertinente.

I.3 - TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. JORNADA. FLEXIBILIZAÇÃO


O Eg. Tribunal Regional negou provimento ao recurso do reclamante ao seguinte fundamento (fls. 462/463):

“Decerto que inexiste Acordo Coletivo. Contudo, a reclamada trouxe aos autos o Dissídio Coletivo nº 131.024/94.0, cuja cláusula 69ª (vide fls. 142) prevê o sistema de compensação para os trabalhadores sujeitos a turnos ininterruptos de revezamento. A sentença normativa é bastante clara ao fixar a jornada de oito horas diárias e carga semanal de 33,6 horas, sem o pagamento de qualquer hora extra.
A cláusula 108ª (fls. 146) prevê que o instrumento vigorará a partir de 1º.09.94 até 31.08.95. Embora o reclamante tenha se aposentado em 30.04.96, a inicial (item 02) alega que o labor em turnos ininterruptos de revezamento somente ocorreu até dezembro de 94. A Sentença Normativa abrange tal período, pelo que não se cogita do pagamento de horas extras.
Ao contrário do que alega o recorrente, esta Justiça Especializada utiliza-se de seu poder normativo, em conformidade com o artigo 114, parágrafo 2º, da CF/88, estabelecendo normas e condições de trabalho e respeitando as disposições convencionais e legais mínimas de proteção ao trabalhador. Não há que se falar em extrapolação de competência, quando, por via de Sentença Normativa, fixou-se a jornada dos trabalhadores sujeitos a regime de turnos ininterruptos de revezamento. Em momento algum houve afronta ao texto do artigo 7º XIV da Carta Magna.

Insurge-se contra tal decisão argumentando que “a LEI MAIOR inseriu a jornada de trabalho de seis horas no Título das Garantias dos Direitos Fundamentais do Trabalhador e só permitiu qualquer modificação através de negociação Coletiva. A negociação Coletiva pressupõe a ocorrência de Acordo Coletivo ou Convenção Coletiva de Trabalho, não permitindo que tal assunto seja objeto de decisão normativa (....)”. Aponta violação do art. 7º, XIV, da CF e traz arestos para confronto.
Adoto, no particular, as razões de decidir constantes do voto proferido nos autos do processo nº TST-ERR-515925/98, SDI-I, Rel. Min. João Batista Brito Pereira, DJU de 28.9.2001, in verbis:

“A Constituição da República, pois, acolheu como forma de flexibilização da jornada de trabalho prevista para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento a negociação coletiva, que é uma forma voluntária de composição dos conflitos coletivos de trabalho (Ives Gandra da Silva Martins Filho. 7ª Ed. ver. e ampl. São Paulo: Saraiva, 1998) e se viabiliza por meio de convenção ou acordo coletivo. Ensina Sérgio Pinto Martins que autocomposição é a forma de solução dos conflitos trabalhistas realizada pelas próprias partes, sem intervenção de um terceiro, e cita como exemplos de formas autocompositivas de solução de conflitos trabalhistas os acordos e as convenções coletivas (Direito processual do trabalho 15. ed. São Paulo: Atlas, 2001, pg. 71) .
Já a sentença normativa, que é proferida em sede de dissídio coletivo, é uma forma impositiva de composição dos conflitos coletivos de trabalho (Ives Gandra da Silva Martins Filho 7ª Ed. ver. e ampl. São Paulo: Saraiva, 1998), em que há a intervenção da jurisdição estatal. Dispõe o art. 114, § 2º, da Constituição da República que, recusando-se qualquer das partes à negociação ou à arbitragem , é facultado aos respectivos sindicatos ajuizar dissídio coletivo, podendo a Justiça do Trabalho estabelecer normas e condições, respeitadas as disposições convencionais e legais mínimas de proteção ao trabalho (grifamos). Assim, apenas tem cabimento o dissídio coletivo e a solução do conflito via poder normativo da Justiça do Trabalho quando frustada a negociação coletiva. Destarte, não há como concluir que o art. 7º, inciso XIV, da Constituição da República comporta para alteração da condição de trabalho ali estabelecida, relativa à jornada para trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, a sentença normativa, uma vez que esta não resulta de negociação coletiva; é fruto da heterocomposição do conflito em que a Justiça do Trabalho impõe a solução.
Nessa mesma linha de raciocínio, lembro a decisão proferida pela da Seção de Dissídio Coletivo no RODC-578.443/99, Rel.: Ministro Vantuil Abdalla, DJ de 24.11.2000, relativo à compensação de jornada de trabalho, in verbis : PISO SALARIAL. Esta Eg. Corte tem entendido que, existindo medida definidora da forma de composição dos salários, ou seja, a livre negociação, inexiste, sobre a questão, campo para a atuação desta Justiça Especializada. JORNADA DE TRABALHO. A matéria em questão é regulada pela Constituição Federal, e a estipulação de qualquer regramento que vá de encontro ao previsto na referida legislação somente seria viável mediante livre negociação entre as partes, nunca através de sentença normativa. Recurso ordinário provido (grifamos).
Conclui-se, pois, que a Constituição da República, ao disciplinar o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, fixa jornada de seis horas e permite transigência. A referência à negociação coletiva exclui a possibilidade de a sentença fixar jornada diversa daquela prevista no art. 7º, inciso XIV, da Constituição da República, porquanto a negociação pressupõe entendimento entre os atores da relação trabalhista enquanto que a sentença normativa resulta, exatamente, da negociação frustrada a justificar a interferência da Justiça do Trabalho, que, ao invés de traduzir um acordo, impõe normas e condições de trabalho”.

CONHEÇO, pois, do recurso por violação do art. 7º, inciso XIV, da Constituição Federal.

II - MÉRITO

II.1 – PRÉMIO DE INCENTIVO À APOSENTADORIA


Em face do conhecimento do recurso de revista por violação aos art. 5º, caput, e 7º, XXXII, da Constituição Federal de 1988, além de divergência jurisprudencial, o seu provimento é medida que se impõe.
Destarte, DOU PROVIMENTO ao recurso de revista do autor, para condenar a reclamada a pagar ao reclamante o prêmio incentivo à aposentadoria.

II.2 - TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO.  FLEXIBILIZAÇÃO

Conhecido por violação do art. 7º, inciso XIV, da Constituição Federal, o seu provimento é medida que se impõe
DOU PROVIMENTO ao recurso de revista para deferir o pagamento como extras das horas excedentes da sexta diária, no período em que ativou em turno ininterrupto de revezamento.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista  quanto ao: I – “PRÊMIO INCENTIVO Á APOSENTADORIA”, por violação dos arts. 5º, caput, e 7º, XXXII, da Constituição e, no mérito, dar-lhe provimento para condenar a reclamada a pagar ao reclamante o prêmio incentivo à aposentadoria; II – “TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO. FLEXIBILIZAÇÃO” por violação do art. 7º, inciso XIV, da Constituição Federal e, no mérito, dar-lhe provimento para deferir o pagamento como extras das horas excedentes da 6ª diária, no período em que ativou em turno ininterrupto de revezamento.  
Brasília, 28 de abril de 2004.


JUIZ CONVOCADO JOSÉ ANTONIO PANCOTTI

Relator

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