terça-feira, 31 de março de 2015

TST DETERMINA QUE CONSELHO ARBITRAL NÃO EXAMINE CONFLITOS TRABALHISTAS

TST determina que conselho arbitral não examine conflitos trabalhistas 


A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho, em sessão realizada nesta quinta-feira (26), determinou que o Conselho Arbitral do Sudoeste da Bahia e a Justiça Arbitral de Vitória da Conquista e Região não realizem arbitragem para solução de conflitos envolvendo direitos individuais trabalhistas em todo e qualquer caso. A arbitragem é a solução de conflitos por meio de árbitros, e não por decisão judicial.
A decisão, que deu provimento a embargos do Ministério Público do Trabalho, ratificou precedentes do TST no sentido de que a arbitragem não é aconselhável na solução de conflitos individuais de trabalho.
Em ação civil pública, o Ministério Público do Trabalho (MPT) pedia que o conselho arbitral se abstivesse de realizar arbitragem envolvendo direitos individuais trabalhistas. O pedido foi julgado improcedente pela primeira instância e pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA). A Quarta Turma do TST, em recurso de revista, considerou admissível a utilização da arbitragem quando já extinta a relação de emprego, proibindo a atuação do conselho apenas nos casos de cláusula que tenha sido objeto do contrato de trabalho ou de aditamento deste durante a vigência da relação empregatícia.
Ao recorrer à SDI-1, em busca do provimento completo do recurso, o MPT sustentou que a arbitragem seria recomendável para solucionar conflitos entre partes equivalentes, o que não acontece no campo do Direito do Trabalho. Defendeu que os princípios protetivo e da irrenunciabilidade, que amparam o direito individual do trabalho, impossibilitariam a adoção da arbitragem para solucionar dissídios individuais trabalhistas.
SDI-1
O ministro José Roberto Freire Pimenta, relator dos embargos, assinalou que, na esfera coletiva, a arbitragem é autorizada e incentivada, devido à relativa igualdade de condições entre as partes negociadoras, pois empregados e empregadores têm respaldo igualitário de seus sindicatos. Destacou, porém, que a Lei 9.307/96, que traça diretrizes para a arbitragem, é clara quando limita o seu campo de atuação aos direitos patrimoniais disponíveis, "que não abrangem os direitos personalíssimos".
O relator ressaltou que, quando se trata da tutela de interesses individuais e concretos de pessoas identificáveis, como, por exemplo, o salário e as férias, é desaconselhável a arbitragem, por ser outro o contexto. "É imperativa a observância do princípio protetivo, fundamento do direito individual do trabalhador, que se justifica em face do desequilíbrio existente nas relações entre trabalhador e empregador", salientou.  "É difícil admitir a possibilidade do comparecimento de um empregado, isoladamente, a uma entidade privada, que não vai observar o devido processo legal, o contraditório e o direito de defesa", observou.
Segundo o ministro, a possibilidade da arbitragem nos dissídios individuais pode ser interessante a priori, mas, na prática, as dificuldades naturais que o empregado vai enfrentar, isolado, são desconsideradas. "Há o perigo de o instituto ser usado para inserir novas regras trabalhistas na relação de emprego, desviando-se de entendimentos sedimentados da Justiça do Trabalho", exemplificou. "São inimagináveis os prejuízos que poderão assolar o trabalhador ante o perigo de se flexibilizarem as normas trabalhistas, pois a arbitragem é realizada por intermédio de regras de direito livremente escolhidas pelas partes".
Projeto de lei
O presidente do TST, ministro Barros Levenhagen, observou, durante a sessão, que tramita no Congresso Nacional matéria que introduz a mediação e a arbitragem no âmbito trabalhista. "Tomei a iniciativa de encaminhar ofício, em nome do Tribunal, manifestando-me contrariamente à adoção do sistema", informou.
(Lourdes Tavares/CF)
A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, composta por quatorze ministros, é o órgão revisor das decisões das Turmas e unificador da jurisprudência do TST. O quorum mínimo é de oito ministros para o julgamento de agravos, agravos regimentais e recursos de embargos contra decisões divergentes das Turmas ou destas que divirjam de entendimento da Seção de Dissídios Individuais, de Orientação Jurisprudencial ou de Súmula.

segunda-feira, 30 de março de 2015

SERVIÇO JUDICIAIS MAIS EFICIENTES (IV, § 1º, ART. 489, NOVO CPC), JUIZ DE SANTA CATARINA

SERVIÇO JUDICIAIS MAIS EFICIENTES (IV, § 1º, ART. 489, NOVO CPC), JUIZ DE SANTA CATARINA 
 
SEGURANÇA JURÍDICA

Novo CPC busca prestação jurisdicional mais rápida, eficiente e completa


O novo Código de Processo Civil vem recheado de mudanças, que trazem esperanças, preocupações e desafios.
Nos dias que antecederam a sanção presidencial assistimos a vários debates entre parte da magistratura, de um lado, e advogados e juristas, de outro. O ponto que mais rendeu discussão foi o da fundamentação adequada das decisões, especificamente aquela prevista no artigo 489, § 1º, IV, que dispõe:
“§ 1º- Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
(...)
IV-  não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador.”
Juristas e advogados aplaudiam a exigência de fundamentação de “todas” as teses, como prática concreta de uma prestação jurisdicional democrática e do direito dos litigantes de saberem, à exaustão, as razões pelas quais seus pedidos foram acolhidos ou rejeitados.
Magistrados, de modo geral, criticavam o dispositivo, considerando-o impertinente. A preocupação nuclear, veiculada pelas associações de juízes, era clara: se hoje já não se consegue dar vazão à demanda – mesmo com o entendimento de que o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão –, quanto mais na vigência do novo Código, que determina que deverão ser enfrentados “todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador.”
No outro polo, as queixas eram quanto à qualidade das decisões judiciais, considerando deficientes os níveis de fundamentação.
É razoável destacar, porém, que, se há insatisfação com a qualidade da prestação jurisdicional, igualmente há críticas à qualidade da postulação. O trabalho de muitos advogados também é questionado pela magistratura. As petições são cada vez mais extensas e carentes de precisão e objetividade, o que dificulta, e muito, o exame de seu efetivo conteúdo.
Daí a preocupação dos juízes de que poderão se avolumar, com o novo Código, as teses que podemos chamar de “onde está Wally?", tal como nos livros tão populares nos anos 90. São aquelas teses que ficam praticamente escondidas no emaranhado de laudas e laudas das petições, rendendo ensejo, por exemplo, ao argumento de que o "sub-item 57 do item 35 da contestação" não foi enfrentado, mas seria capaz de infirmar a conclusão do julgador.
A sequência previsível dessa realidade é a abertura para “sedutores” embargos de declaração, notadamente por aqueles que não querem a rápida solução do processo.
Outra crítica da magistratura, penso que com boa margem de razão, era direcionada à redação extremamente genérica do dispositivo.
Todavia, o que fica de todo esse debate, após a sanção do CPC, é a necessidade de buscar caminhos para que a vontade do legislador se torne realidade.
Gostemos ou não, as decisões precisarão enfrentar as teses basilares invocadas pelas partes, em cumprimento ao artigo 489, § 1º, IV.
Mas será que os juízes ficarão reféns daquelas petições com pouca qualidade ou com teses camufladas, para só depois serem alertados nos embargos de declaração de que faltou examinar a tese “a” ou “b”?
Penso que não. O próprio Código apresenta as soluções para evitar essa sensação de aparente desconforto, com previsão de técnicas de saneamento, organização e preparação do processo rumo à decisão de mérito, em nítida evolução do que hoje está posto no CPC.
Pessoalmente, na condição de juiz, sempre fui adepto da técnica de proferir decisão de saneamento em audiência, com base no artigo 331, § 2º do Código atual. Os resultados eram muito bons – ótimos eu diria.
Explico: Marcava a solenidade e intimava as partes e advogados. Inviável a conciliação, depois de superadas eventuais questões preliminares, passava, em diálogo franco e direto com os advogados, a fixar os pontos controvertidos sobre os quais incidiria a prova e quais as modalidades probatórias pretendidas pelas partes.
Quantas vezes alguém pedia a inquirição de testemunhas e eu alertava que o fato específico já estava provado por memória documental. Via de regra o advogado concordava e desistia. Se assim não fizesse, a prova era indeferida, justificando o motivo e relatando que a circunstância tinha sido exposta ao requerente naquele ato; noutras vezes eu demonstrava que o fato era incontroverso e por isso não demandava dilação probatória - e as adesões eram praticamente unânimes ao aceitar a ponderação. Tudo isso ficava consignado em detalhes no termo de audiência e era praticamente zero o número de agravos decorrentes de tais decisões.
Quando se chegava na audiência de instrução e julgamento, o processo estava todo organizado, o que permitia a coleta do material probatório com bastante objetividade.
E tudo era alcançado, frise-se, pelo contato direto com os advogados e com as benesses da oralidade, que rende muito mais, em poucas palavras, que as justificativas alongadas das decisões escritas.
Pois bem, o novo Código de Processo Civil avança muito em tal perspectiva e amplia, sobremaneira, as possibilidades de organização do processo para uma boa decisão de mérito, e isso não se restringe à atividade probatória, porque poderá haver a explicitação e delimitação dos temas jurídicos a serem enfrentados.
Confira-se:
"Art. 357. Não ocorrendo nenhuma das hipóteses deste Capítulo, deverá o juiz, em decisão de saneamento e de organização do processo:
(...)
II – delimitar as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos;
(...)
IV – delimitar as questões de direito relevantes para a decisão do mérito;"
Essas regras devem ser comemoradas!
Além da delimitação das questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, surge a  grande e auspiciosa novidade do inciso IV: a delimitação das questões de direito relevantes para a decisão do mérito.
Esse compartimento do Código convida todos os participantes do processo a contribuir para uma boa qualidade da prestação jurisdicional.
E também é muito bem-vinda a regra e a inspiração do § 2º:
“As partes podem apresentar ao juiz, para homologação, delimitação consensual das questões de fato e de direito a que se referem os incisos II e IV, a qual, se homologada, vincula as partes e o juiz.”
Trata-se de compartilhamento democrático da cena processual, na qual as partes dizem ao Estado-juiz o que elas esperam do resultado da prestação jurisdicional.
Aqui, o Código cristaliza, mais uma vez, a ideia de cooperação prevista no artigo 6º, que diz:
“Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.”
Se a matéria for complexa, o § 3º indica a necessidade de designação de audiência, para que o saneamento seja feito em cooperação, oportunidade em que o juiz, se for o caso, convidará as partes a integrar ou esclarecer suas alegações.
Mesmo que a matéria não seja complexa sob o ângulo probatório ou de mérito, abre-se porta para a designação de tal solenidade, porque o princípio da oralidade e as vantagens da interação presencial justificam a adoção dessa providência.
E o desdobramento natural é que a delimitação prévia das questões de direito não fique restrita às hipóteses em que o processo chegue na fase do saneamento concentrado. Mesmo nos casos de julgamento antecipado do mérito, pode (e deve) o juiz intimar as partes para que explicitem, por petição, quais as questões de direito e de fato (teses) querem ver examinadas na decisão, mesmo que elas não tenham chegado ao consenso referido no § 2º.
Isso permitirá que o magistrado saiba, sem surpresas posteriores, o que as partes esperam da prestação jurisdicional.
Essa técnica de organização do processo rumo à decisão de mérito não deve ser encarada como um fardo procedimental; ao contrário, é exatamente pela adoção de tais medidas que serão abertos os caminhos para uma decisão segura, com responsabilidades devidamente compartilhadas.
Ficará, assim, bem mais previsível e estável a obrigação de enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão do julgador.
Em outras palavras, há que se buscar a prévia delimitação das questões de direito relevantes para a decisão de mérito, a fim de que todos os sujeitos do processo saibam de antemão quais teses devam ser enfrentadas, permitindo melhor rendimento à atividade decisória e evitando “aquelas bombas de efeito retardado”, detonáveis pelo manejo dos embargos declaratórios nos quais se sustentam as omissões.
Prestígio à cooperação e ao diálogo, segurança jurídica, prestação jurisdicional mais completa e razoabilidade no tempo para a solução justa do litígio – eis o que busca o CPC/2015.
Assim, ao mesmo tempo em que o novo Código exige dos magistrados o exame das teses basilares sustentadas pelas partes, também fornece as técnicas para a identificação dos temas que necessariamente devam ser enfrentados.
E esse diagnóstico, a ser realizado mediante contraditório substancial, não será tarefa isolada dos juízes. Em cooperação, estarão a seu lado os advogados das partes.
Vamos abrir nossos corações ao novo Código de Processo Civil. Sejamos humildes para desaprender o que é preciso e para reaprender o que é necessário. E há muito por fazer, nos dois sentidos.

 é juiz do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

sexta-feira, 27 de março de 2015

TST: HIGIENIZAÇÃO DE BANHEIROS DE SUPERMERCADO ENSEJA O ADICIONAL DE INSALUBRIDADE

Auxiliar de limpeza que higienizava banheiros de supermercado receberá adicional de insalubridade


(Qui, 26 Mar 2015 07:32:00)
A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a rede de supermercados Companhia Zaffari Comércio e Indústria ao pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo a uma auxiliar de limpeza que fazia a limpeza de banheiros de um supermercado do grupo empresarial em São Leopoldo (RS).
Admitida em março de 2007, a empregada limpava sanitários, recolhia o lixo, varria o piso e limpava a área administrativa. A partir de 2010, passou a trabalhar apenas no setor administrativo, limpando o vestiário feminino.
Reclamação trabalhista
A empregada ajuizou ação na 3ª Vara do Trabalho de São Leopoldo alegando violação ao Anexo 14 da Norma Regulamentadora 15, do Ministério do Trabalho e Emprego, que garante adicional de insalubridade em grau máximo aos trabalhadores que mantêm contato permanente com agentes biológicos, como o lixo urbano. Pediu o recebimento do adicional e seus reflexos sobre FGTS e multa de 40%, férias com 1/3, 13º salário, aviso-prévio indenizado e horas extras.
A Zaffari afirmou na contestação que a empregada não matinha contato com agentes biológicos, já que, além de utilizar equipamentos de proteção individual (EPIs), os papéis recolhidos nos banheiros eram colocados em lixeiras, e ela só tinha de fechar os sacos de lixo e retirá-los do local. A entidade também afirmou que, a partir de 2010, a trabalhadora não teve mais contato com sanitários de grande movimentação.
O juízo de primeiro grau deferiu o pedido e condenou a Zaffari a pagar o adicional conforme a NR-15 e seus reflexos até outubro de 2012, mês em que a trabalhadora entrou em beneficio previdenciário. O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) acolheu recurso da empresa e excluiu a condenação por entender que a limpeza de sanitários em estabelecimentos específicos, independentemente do número de circulação de pessoas, não se equipara ao trabalho em contato permanente com lixo urbano ou com esgoto.
TST
O relator do processo no TST, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, acolheu o recurso e restabeleceu a sentença. Ele assinou que o TST tem entendimento pacificado na Súmula 448 no sentido de que a higienização de sanitários de uso público e de grande circulação justifica o pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo.
A decisão foi unânime.
(Alessandro Jacó/CF)
O TST possui oito Turmas julgadoras, cada uma composta por três ministros, com a atribuição de analisar recursos de revista, agravos, agravos de instrumento, agravos regimentais e recursos ordinários em ação cautelar. Das decisões das Turmas, a parte ainda pode, em alguns casos, recorrer à Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-1).

terça-feira, 24 de março de 2015

TST: FGV É CONDENADA A INDENIZAR PROFESSORA DISPENSADA POR MOTIVOS POLÍTICOS



A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento a agravo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) contra condenação ao pagamento de R$ 100 mil de indenização por danos morais a uma professora titular dispensada sem justa causa em 2006. A professora, com 34 anos de FGV e pós-doutorado, alegou prejuízo acadêmico e à sua imagem em decorrência da demissão por motivos políticos, e pleiteou R$ 500 mil de indenização. A Justiça do Trabalho da 2ª Região também determinou a reintegração.
Reputação acadêmica
A professora, admitida mediante concurso de provas e títulos, com mestrado, doutorado e pós-doutorado, obteve o grau máximo na carreira acadêmica - professora titular – e ocupou diversos cargos administrativos na FGV, por meio de eleição. Ao requerer a indenização, afirmou que a demissão "lançou sombras sobre sua reputação e imagem no meio acadêmico junto aos demais professores e colegas e também perante os alunos".
Ela afirmou, na reclamação trabalhista, que a dispensa, "procedimento insólito e nunca antes adotado pela FGV com outro professor", foi discriminatória e atingiu diretamente a sua pessoa, a sua honra e boa-fama, o seu caráter e a sua imagem, como professora, pesquisadora e autora junto à comunidade acadêmica do país.
De acordo com o depoimento em audiência de uma das testemunhas, em fevereiro de 2006, o então diretor promoveu demissão em massa de professores, de forma arbitrária e imotivada, sem submissão aos órgãos de representação, como até então se fazia. Segundo relatos, a professora tinha projeção entre alunos, colegas e diretoria, além de externamente, e, nas eleições para a direção, ter dado apoio a candidato contrário ao que a demitiu.
O entendimento do TRT-SP foi de que os estatutos e o regimento da FGV estabelecem norma para a demissão de professores, exigindo que o diretor formule proposta à entidade mantenedora, o que não ocorreu no caso. Dessa forma, a dispensa não observou o regimento e, de acordo com prova testemunhal, teve nítido propósito político, resultando em prejuízo para a professora.
A Fundação interpôs recurso de revista que teve seguimento negado pelo TRT, o que a fez apelar ao TST com agravo de instrumento, sustentando que a professora não tinha estabilidade e que a dispensa não configurou conduta ilícita. Na avaliação do relator, ministro Augusto César Leite de Carvalho, o exame das alegações do recurso ou da veracidade das conclusões do Tribunal Regional dependeria de nova análise do conjunto de fatos e provas, tarefa vedada no TST (Súmula 126). A FGV interpôs embargos à SDI-1, ainda não examinados.
(Lourdes Tavares/CF)

sábado, 21 de março de 2015

SENTENÇA NA AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CONDENAÇÃO JOSÉ LEVY FEDELIX -

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO


COMARCA DE SÃO PAULO
FORO CENTRAL CÍVEL
18ª VARA CÍVEL
PRAÇA JOÃO MENDES S/Nº, São Paulo - SP - CEP 01501-900

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1098711-29.2014.8.26.0100 - lauda 1
SENTENÇA



Processo Digital nº: 1098711-29.2014.8.26.0100
Classe - Assunto Ação Civil Pública - Indenização por Dano Material
Requerente: Defensoria Pública do Estado de São Paulo
Requerido: José Levy Fidelix da Cruz e outro


Justiça Gratuita


Juiz(a) de Direito: Dr(a). Flavia Poyares Miranda


Vistos.


Trata-se de ação civil pública ajuizada pela DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO
DE SÃO PAULO contra JOSÉ LEVY FIDELIX DA CRUZ E PARTIDO RENOVADOR
TRABALHISTA BRASILEIRO (PRTB) alegando a autora, em apertada síntese, que no último dia


28 de setembro de 2014, a Rede Record transmitiu um debate entre os candidatos à Presidência da
República nas eleições que ocorreram no dia 5 de outubro de 2014. A candidata Luciana Genro fez
uma pergunta ao candidato José Levy Fidelix, cujo objetivo era questionar o motivo pelo qual
muitos daqueles que defendem a família se recusam a reconhecer o direito de casais de pessoas do
mesmo sexo ao casamento civil. Em resposta o réu afirmou que “dois iguais não fazem filho” e
que “aparelho excretor não reproduz”. O candidato teria comparado a homossexualidade à
pedofilia, que é ato criminoso, afirmando que o Papa Francisco vem promovendo ações de
combate ao abuso sexual infantil, afastando sacerdotes suspeitos da prática. O candidato teria
afirmado ainda que o mais importante é que a população LGBT seja atendida no plano psicológico
e afetivo, mas “bem longe da gente”. O candidato teria ultrapassado os limites da liberdade de
expressão, incidindo em discurso de ódio. Em razão dos fatos alegados termina por requerer a
concessão de liminar para que os requeridos arquem com os custos da produção de um programa,
com a mesma duração dos discursos de Levi Fidelix, e na mesma faixa de horário da programação,
que promova os direitos da população LGBT, a intimação do Ministério Público, a procedência da
ação tornando definitiva a tutela antecipada, assim como para determinar que os réus reparem o
dano moral coletivo praticado, através do pagamento de R$1.000.000,00 (um milhão de reais), que
reverterá para as ações de promoção de igualdade da população LGBT, conforme definição do
Conselho Nacional de Combate à Discriminação LGBT, em analogia ao disposto no § 2º do artigo
13 da Lei 7.347/85, bem como a fixação de multa diária nos termos do artigo 11 da Lei 7.347/85
no valor de R$500.000,0 (quinhentos mil reais) por cada ato de descumprimento da ordem
judicial. Com a inicial, vieram documentos (fls.22/67).
O Ministério Público opinou a fls. 76/85 pela concessão da tutela antecipada,
sendo demonstrados os fatos, sendo contundentes os fundamentos jurídicos que sustentam a
ocorrência de violação de direitos da coletividade. Prosseguindo, sustenta que a liberdade de

Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1098711-29.2014.8.26.0100 e o código EEA87B.
Este documento foi assinado digitalmente por FLAVIA POYARES MIRANDA.
fls. 206

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expressão e o pluralismo político são pilares do Estado Democrático de Direitos, garantias
essenciais à tutela da diversidade e da dignidade humana, merecendo especial resguardo em
épocas eleitorais, quando o amplo debate apresenta importantes reflexos na garantia à livre
convicção política da população e à representatividade popular dos candidatos eleitos. Todavia, a
liberdade de expressão, ainda que configure direito caro à sociedade, não é absoluta, apresentando
limites constitucionais quando implica em violações a direitos fundamentais do homem. É o que
se constata no caso concreto, em que as declarações do requerido negam a própria dignidade
humana à população LGBT. Vale ressaltar que não se nega o direito do então candidato à
presidência da república de manifestar seus posicionamentos políticos sobre a questão
homossexual. É salutar, aliás, que o assunto, de extrema relevância social, seja objeto de pautas
das discussões eleitorais. Agindo dessa forma, propaga-se discurso de ódio contra uma minoria
que vem lutando historicamente, a duras penas, pela garantia de direitos fundamentais mínimos. A
exordial narra fatos concretos e reiterados de agressões contra homossexuais em razão da sua
opção sexual, muitas das quais culminaram inclusive com a morte das vítimas. Isso reflete uma
triste realidade brasileira de violência e discriminação a esse segmento, a qual deve ser objeto de
intenso combate pelo Poder Público, em sua função primordial de tutela da dignidade humana.
Portanto, agiu de forma irresponsável o candidato Levy Fidelix e, em consequência, o seu partido
ao propagar discurso de teor discriminatório. Na qualidade de pessoa pública formadora de
opinião, que obteve número relevante de votos no primeiro turno das eleições presidenciais de
2014, ao discursar em rede televisiva a todo o Brasil, tinha o dever ético e jurídico de atuar em
consonância com os fundamentos da Constituição. Nese contexto, as consequências do discurso,
pela gravidade do seu teor e porque divulgado em âmbito nacional no curso de eleições
presidenciais, são deletérias à sociedade. De fato, os efeitos nocivos das declarações adotaram
dimensões especialmente amplas, na medida em que as ofensas do então candidato à população
LGBT propagam falso sentimento de legitimação política de condutas discriminatórias,
fortalecendo-se as condutas de exclusão e violência contra essa minoria. O discurso perpetrado,
portanto, consubstancia-se não só como um desserviço à sociedade democrática; mais do que isso,
nega dignidade humana à população LGBT, violando frontalmente a Constituição Federal de
1988. Afrontas desse teor fogem à liberdade de expressão e de manifestação política, demandando,
portanto, resposta efetiva e firme do Poder Judiciário, que não pode compactuar com essa
realidade, sob pena de assistir, impassível, a efetiva regressão social em matéria de direitos
humanos.
Foi indeferida a tutela antecipada nos termos da decisão proferida a fl.86.
Foi noticiada a interposição de Agravo de Instrumento.
Citado, o requerido PRTB apresentou contestação a fls. 112/121 impugnando a
pretensão autoral. Pleiteou a isenção de custas processuais. Arguiu preliminar de ilegitimidade
ativa “ad causam” da Defensoria Pública e ilegitimidade passiva do Partido, invocando o artigo 15-
A da Lei 9.096/95. No mérito, em nenhum momento o candidato incitou o ódio, mas sim
manifestou o seu pensamento em debate televisivo. No final da resposta, pontuou que se está na
lei, que fique como está, mas estimular jamais a união homoafetiva. O candidato para ilustrar sua
postura firme e clara, quanto ao controvertido tema trazido na pergunta realizada, de forma
ilustrativa, citou coo paradigma de sua postura o maior líder de sua religião, o Papa Francisco, que
expulsou da Igreja Padre pedófilo. O candidato deixou clara sua postura ideológica, quanto ao
casamento igualitário entre pessoas do mesmo sexo, no sentido de demonstrar sua posição.
Menciona Deputados que apresentaram projetos de lei ao Congresso Nacional colocando em

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discussão o assunto. A postura do candidato não é homofóbica. Termina por requerer o
acolhimento das preliminares ou então a improcedência. Trouxe documentos.
Citado, o requerido José Levy Fidelix da Cruz também impugnando a pretensão
autoral, reiterando os argumentos apresentados pelo corréu. Afirma que não incitou o ódio, mas
sim manifestou seu pensamento em debate eleitoral televisivo. No contexto de sua negativa, o
requerido deixou claro à população brasileira sua postura de defensor da família contemplada no
artigo 1.514 do Código Civil combinado com o artigo 226 parágrafo 5º da Constituição Federal. O
requerido não agiu de forma hipócrita e dissimulada somente para angariar votos da Comunidade
LGBT. Termina por requerer o acolhimento da preliminar ou então a improcedência, com os
consectários legais. Trouxe documentos.
Réplica acostada.


É O RELATÓRIO.

FUNDAMENTO E DECIDO.
A questão de fato e de direito encontra-se suficientemente dirimida pela prova
documental, sendo que o feito comporta julgamento antecipado ante a desnecessidade de produção
de provas em audiência, razão pela qual passo ao imediato julgamento na forma do artigo 330, I do
Código de Processo Civil.
Nesse sentido:


"Tendo o Magistrado elementos suficientes para o esclarecimento da questão, fica
o mesmo autorizado a dispensar a produção de quaisquer outras provas, ainda que já tenha



saneado o processo, podendo julgar antecipadamente a lide, sem que isso configure cerceamento



de defesa" (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor - Theotônio Negrão Ed.


Saraiva 31ª ed. -pág. 397).


"O propósito de produção de provas não obsta ao julgamento antecipado da lide,



se os aspectos decisivos da causa se mostram suficientes para embasar o convencimento do



magistrado" (STF- RE 96725/RS - Rel. Min. Rafael Mayer).



“Cerceamento de defesa. Não configuração. Questões eminentemente de direito.
Desnecessidade de perícia contábil ou de produção de prova oral. Preliminar afastada ....”


(Apelação nº 991.07.002767-0 (7.123.098-7)/ Araçatuba, rel. Des. Luis Carlos de Barros).
Ora, estando em termos o processo, o Juiz deve julgá-lo desde logo:

"Presentes as condições que ensejam o julgamento antecipado da causa, é dever



do juiz, e não mera faculdade, assim proceder". (STJ, 4a T., REsp n° 2.832-RJ, rel. Min. Sálvio de


Figueiredo, j . 14.8.1990) No mesmo sentido: RSTJ 102/500 e RT 782/302.
A presente ação civil pública visa à tutela dos direitos individuais homogêneos,
assim entendidos aqueles que possuem origem comum, dispensando, todavia, a existência de uma
relação jurídica entre seus titulares, ou mesmo entre esses e o causador do dano.
São direitos divisíveis, na medida em que se mostra possível a quantificação da

Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1098711-29.2014.8.26.0100 e o código EEA87B.
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pretensão de cada um dos interessados. Seus titulares são identificados e determinados.
Sua finalidade é permitir a prestação jurisdicional de maneira uniforme, ágil e
eficiente, aos consumidores lesados em decorrência de um mesmo fato de responsabilidade do
fornecedor.
Dispõe o artigo 134 da Constituição Federal que:

“Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função
jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime
democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos
humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos
individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma
do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal.”


Assim, a Defensoria Pública é legitimada ativa para a defesa de interesses
individuais homogêneos, nos termos dos artigos 81 e 82 do Código de Defesa do Consumidor.
Neste sentido:
“ENSINO ENEM ALUNOS INSCRITOS DADOS EXPOSIÇÃO
SIGILO PROTEÇÃO DEFENSORIA PÚBLICA LEGITIMIDADE
“Administrativo e processual civil. Ação civil pública. Exposição dos dados dos
alunos inscritos no Enem. Proteção à intimidade e ao sigilo de dados.
Legitimidade da defensoria pública. Art. 5º, inciso II, da Lei nº 7.347/1985
(redação dada pela Lei nº 11.448/2007). 1. Ação civil pública intentada pela DPU
cujo objetivo é a obtenção de provimento jurisdicional que determine a dados
cadastrais dos alunos que se inscreveram no Enem nos anos de 2007, 2008, e
2009. 2. A defensoria pública tem legitimidade ativa ad causam para propor ação
civil pública com o objetivo de defender interesses individuais homogêneos de
relevância social, assegurando a dignidade da pessoa humana, entendida como
núcleo central dos direitos fundamentais (REsp 1.106.515/MG, Rel. Min. Arnaldo
Esteves Lima, 1ª Turma, DJe 02.02.2011). Apelação provida.” (TRF 5ª R. AC
0012813-81.2010.4.05.8100/CE 3ª T. Rel. Des. Fed. Geraldo Apoliano DJe
01.04.2013)”
Afasto também a preliminar de ilegitimidade passiva, eis que as declarações do
requerido não se encontram desvinculadas de seu Partido, aliás, o mesmo participou do debate
justamente representando a sua agremiação política.
O mais é matéria de mérito e com ele deve ser analisado.
Por primeiro, anoto que o direito de um indivíduo não pode eliminar o direito do
outro, seu semelhante.


Para Immanuel Kant1, a Ética define as regras respeitadas pelos indivíduos que


tem liberdade para escolher aquelas que valeriam para todos os demais.


1 KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura. Tradução de Valério Rohden e Udo Baldur Moosburg. São Paulo. Abril


Cultural, 1980.

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Já a Moral2 pode ser definida como um conjunto de regras de conduta ou hábitos


julgados válidos, quer de modo absoluto, quer para grupo ou pessoas determinadas.
Respeitado entendimento diverso, como bem acentuou o D. Representante do
Ministério Público, a conduta descrita na inicial ultrapassou a liberdade de expressão assegurada
constitucionalmente, não podendo ser aceita a tese defensiva de que o candidato apenas estava
expondo a sua postura ideológica, valendo destacar o seu Parecer:

“(...) a liberdade de expressão e o pluralismo político são pilares do Estado
Democrático de Direitos, garantias essenciais à tutela da diversidade e da
dignidade humana, merecendo especial resguardo em épocas eleitorais, quando o
amplo debate apresenta importantes reflexos na garantia à livre convicção
política da população e à representatividade popular dos candidatos eleitos.
Todavia, a liberdade de expressão, ainda que configure direito caro à sociedade,
não é absoluta, apresentando limites constitucionais quando implica em violações
a direitos fundamentais do homem. É o que se constata no caso concreto, em que
as declarações do requerido negam a própria dignidade humana à população
LGBT. Vale ressaltar que não se nega o direito do então candidato à presidência
da república de manifestar seus posicionamentos políticos sobre a questão
homossexual. É salutar, aliás, que o assunto, de extrema relevância social, seja
objeto de pautas das discussões eleitorais. Agindo dessa forma, propaga-se
discurso de ódio contra uma minoria que vem lutando historicamente, a duras
penas, pela garantia de direitos fundamentais mínimos. A exordial narra fatos
concretos e reiterados de agressões contra homossexuais em razão da sua opção
sexual, muitas das quais culminaram inclusive com a morte das vítimas. Isso
reflete uma triste realidade brasileira de violência e discriminação a esse
segmento, a qual deve ser objeto de intenso combate pelo Poder Público, em sua
função primordial de tutela da dignidade humana. Portanto, agiu de forma
irresponsável o candidato Levy Fidelix e, em consequência, o seu partido ao
propagar discurso de teor discriminatório. Na qualidade de pessoa pública
formadora de opinião, que obteve número relevante de votos no primeiro turno
das eleições presidenciais de 2014, ao discursar em rede televisiva a todo o
Brasil, tinha o dever ético e jurídico de atuar em consonância com os
fundamentos da Constituição. Nese contexto, as consequências do discurso, pela
gravidade do seu teor e porque divulgado em âmbito nacional no curso de
eleições presidenciais, são deletérias à sociedade. De fato, os efeitos nocivos das
declarações adotaram dimensões especialmente amplas, na medida em que as
ofensas do então candidato à população LGBT propagam falso sentimento de
legitimação política de condutas discriminatórias, fortalecendo-se as condutas de
exclusão e violência contra essa minoria. O discurso perpetrado, portanto,
consubstancia-se não só como um desserviço à sociedade democrática; mais do
que isso, nega dignidade humana à população LGBT, violando frontalmente a
Constituição Federal de 1988. Afrontas desse teor fogem à liberdade de expressão
e de manifestação política, demandando, portanto, resposta efetiva e firme do
Poder Judiciário, que não pode compactuar com essa realidade, sob pena de
assistir, impassível, a efetiva regressão social em matéria de direitos humanos”.


Portanto, ao afirmar que “dois iguais não fazem filho” e que “aparelho excretor


2 Novo Dicionário Aurélio, 3ª edição, Ed. Positivo, p.1359


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não reproduz”, comparando a homossexualidade à pedofilia, e que o mais importante é que a
população LGBT seja atendida no plano psicológico e afetivo, mas “bem longe da gente”,
respeitado entendimento diverso, o candidato ultrapassou os limites da liberdade de expressão,
incidindo sim em discurso de ódio, pregando a segregação do grupo LGBT.
Não se nega o direito do candidato em expressar sua opinião, contudo, o mesmo
empregou palavras extremamente hostis e infelizes a pessoas que também são seres humanos e
merecem todo o respeito da sociedade, devendo ser observado o princípio da igualdade.
No que tange aos danos morais, a situação causou inegável aborrecimento e
constrangimento a toda população, não havendo justificativa para a postura adotada pelo
requerido.
De acordo com o artigo 226 parágrafo terceiro da Constituição Federal temos
positivado que:

“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do
Estado.(...)
§ 3º. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união
estável entre o homem e a mulher como entidade familiar,
devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”.


A Carta Constitucional ainda dispõe que:

“Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil:
(...)
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”


Ora, em um primeiro momento seria possível cogitar que somente a entidade
familiar formada por um homem e uma mulher mereceriam proteção jurídica.


Contudo, aplicando-se os princípios da razoabilidade e da dignidade da pessoa


humana, bem como adotando-se uma interpretação sistemática dos dispositivos constitucionais
acima transcritos podemos concluir que as uniões estabelecidas entre pessoas do mesmo sexo
devem ser reconhecidas e igualmente tuteladas.


Assim sendo, mister se faz que o Direito acompanhe a evolução da sociedade.
Maria Berenice Dias3 de forma bastante esclarecedora pondera que:


“6. Uniões homoafetivas
De forma cômoda, o Judiciário busca não ver e nada deferir


3 Uniões homoafetivas: uma realidade que o Brasil insiste em não ver Maria Berenice Dias. Disponível no

site: www.mbdias.com.br; www.mariaberenice.com.br www.direitohomoafetivo.com.br acessado em


14 de setembro de 2010.


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quando a causa tem por fundamento união entre duas pessoas do
mesmo sexo. No máximo busca subterfúgios no campo do Direito
das Obrigações, identificando como sociedade de fato o que nada
mais é do que uma sociedade de afeto. A exclusão de tais
relacionamentos da órbita do Direito de Família acaba impedindo
a concessão dos direitos que defluem das relações familiares, tais
como meação, herança, usufruto, habitação, alimentos, benefícios
previdenciários, entre tantos outros. Relegar essas questões ao
âmbito obrigacional gera, no mínimo, um contra-senso. Os juízes
de família acabavam se socorrendo de distinto ramo do Direito
para o qual não detêm competência. Descabe continuar pensando
com preconceitos, isto é, com conceitos preestabelecidos e que
ainda se encontram encharcados de conservadorismo. É necessário
pensar com conceitos jurídicos, e para isso é necessário pensar
novos conceitos. Daí a missão fundamental da jurisprudência.
Necessita o juiz desempenhar seu papel de agente transformador
de conceitos estagnados, tal como ocorreu com a união estável
heterossexual. A alteração do conceito social das chamadas
relações concubinárias foi provocada pelos operadores do Direito.
Quando passou a Justiça a extrair conseqüências jurídicas dos
relacionamentos extramatrimoniais, isso as fez serem reconhecidas
como entidade familiar em sede constitucional. Ao menos até que
o legislador pátrio siga a trilha da Justiça e flagre o descaso do
Estado em regulamentar tais relações, que merecem como já
conquistaram na maioria dos países do mundo uma
regulamentação própria, a responsabilidade é do Poder Judiciário.
Ainda que tenha vindo a Constituição, com ares de modernidade,
outorgar proteção à família, independentemente da celebração do
casamento, continuaram ignoradas as entidades familiares
formadas por pessoas do mesmo sexo. No entanto, não mais se
diferencia a família pela ocorrência do casamento. A existência de
um par heterossexual não é requisito essencial para que a
convivência mereça reconhecimento como entidade familiar.
Basta atentar em que a proteção constitucional é outorgada
também às famílias monoparentais. Assim, nem a prole nem a
capacidade procriativa são pressupostos para que a convivência de
duas pessoas mereça a proteção jurídica. Por tais fundamentos, é
descabido deixar fora do conceito de família as relações
homoafetivas. Presentes os requisitos de vida em comum,
coabitação, laços afetivos, mister conceder aos casais
homossexuais os mesmos direitos deferidos às uniões
heterossexuais que tenham idênticas características. Diante da
lacuna da lei, deve o julgador se socorrer do art. 4º da Lei de
Introdução ao Código Civil, que determina a aplicação da
analogia, dos costumes e princípios gerais de direito. Ante a falta
de normatização, só pode ser feita analogia com as demais
relações que têm o afeto por causa, ou seja, o casamento e a união
estável. Enquanto a lei não acompanha a evolução da sociedade, a

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mudança de mentalidade, o avanço do conceito de moralidade,
ninguém, muito menos os juízes, pode, de forma preconceituosa
ou discriminatória, fechar os olhos a essa nova realidade e ser
fonte de grandes injustiças. Descabe confundir questões jurídicas
com questões morais ou religiosas. A mesma responsabilidade,
outrora, assumiu a Justiça com referência às uniões extraconjugais.
Deve agora mostrar igual independência e coragem quanto às
uniões homossexuais. Ambas são relações afetivas, vínculos em
que há comprometimento amoroso. Assim, é imperioso reconhecer
a existência de um gênero de união estável que comporta mais de
uma espécie: relações hetero e homoafetivas. Ambas fazem jus à
mesma proteção. Enquanto não surgir legislação que regule
especificamente as uniões homossexuais, é de aplicar-se a
legislação pertinente aos vínculos familiares. Indispensável que se
passe a aceitar que os vínculos homoafetivos configuram uma
categoria social que não pode mais ser discriminada ou
marginalizada pelo preconceito. Está na hora de o Estado, que se
quer democrático e que consagra como princípio maior o respeito
à dignidade da pessoa humana, reconhecer que todos os cidadãos
dispõem do direito individual à liberdade, do direito social de
escolha e do direito humano à felicidade.”


Paulo Luiz Neto Lobo em magistral artigo4 também perfilha deste entendimento:


“10 Da União Homossexual como Entidade Familiar
As uniões homossexuais seriam entidades familiares
constitucionalmente protegidas? Sim, quando preencherem os
requisitos de afetividade, estabilidade e ostensibilidade. 12 A
norma de inclusão do art. 226 da Constituição apenas poderia ser
excepcionada se houvesse outra norma de exclusão explícita de
tutela dessas uniões. Entre as entidades familiares explícitas há a
comunidade monoparental, que dispensa a existência de par
andrógino (homem e mulher).
A ausência de lei que regulamente essas uniões não é impedimento
para sua existência, porque as normas do art. 226 são autoaplicáveis,
independentemente de regulamentação. Por outro lado,
não vejo necessidade de equipará-las à união estável, que é
entidade familiar completamente distinta, somente admissível
quando constituída por homem e mulher (§ 3º do art. 226). Os
argumentos que têm sido utilizados no sentido da equiparação são
dispensáveis, uma vez que as uniões homossexuais são
constitucionalmente protegidas enquanto tais, com sua natureza
própria.


4 ENTIDADES FAMILIARES CONSTITUCIONALIZADAS: PARA ALÉM DO NUMERUS CLAUSUS -


Paulo Luiz Netto Lobo (Publicada na Revista Brasileira de Direito de Família nº 12 - JAN-FEV-MAR/2002,
pág. 40) Paulo Luiz Netto Lobo Doutor em Direito Civil (USP), Diretor do Instituto Brasileiro de Direito de
Família, Professor na UFPE (Mestrado e Doutorado) e na UFAL.

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O argumento da impossibilidade de filiação não se sustenta, pelas
seguintes razões: a) a família sem filhos é família tutelada
constitucionalmente; b) a procriação não é finalidade indeclinável
da família constitucionalizada; c) a adoção permitida a qualquer
pessoa, independentemente do estado civil (art. 42 do ECA), não
impede que a criança se integre à família, ainda que o parentesco
civil seja apenas com um dos parceiros.
Os tribunais brasileiros demonstram maior receptividade para
atribuição de efeitos às uniões homossexuais, ainda que sob a
indevida qualificação de “sociedade de fato”. O Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul julgou caso decorrente da relação
homossexual de dois homens, que viveram juntos durante trinta
anos. Um deles, que adotou uma menina, deixou patrimônio que
foi disputado entre a filha e o outro companheiro. O Tribunal
reconheceu, com razão, a existência da entidade familiar, e
segundo o modelo do direito de família, decidindo pela meação
entre a filha e o companheiro sobrevivente. A justiça federal do
Rio Grande do Sul tem decidido no sentido de determinar ao INSS
a concessão aos parceiros homossexuais dos mesmos benefícios
previdenciários devidos aos cônjuges e companheiros de união
estável. 13
Além da invocação das normas da Constituição que tutelam
especificamente as relações familiares, preferidas nesta exposição,
a doutrina tem encontrado fundamento para as uniões
homossexuais no âmbito dos direitos fundamentais, sediados no
art. 5º, notadamente os que garantem a liberdade, a igualdade sem
distinção de qualquer natureza, a inviolabilidade da intimidade e
da vida privada. Tais normas assegurariam “a base jurídica para a
construção do direito à orientação sexual como direito
personalíssimo, atributo inerente à pessoa humana”. 14
Conclusão
Os tipos de entidades familiares explicitamente referidos na


Constituição brasileira não encerram numerus clausus. As


entidades familiares, assim entendidas as que preencham os
requisitos de afetividade, estabilidade e ostensibilidade, estão
constitucionalmente protegidas, como tipos próprios, tutelando-se
os efeitos jurídicos pelo direito de família e jamais pelo direito das
obrigações, cuja incidência degrada sua dignidade e das pessoas
que as integram. A Constituição de 1988 suprimiu a cláusula de
exclusão, que apenas admitia a família constituída pelo casamento,
mantida nas Constituições anteriores, adotando um conceito
aberto, abrangente e de inclusão.

Violam o princípio constitucional da dignidade da pessoa
humana as interpretações que (a) excluem as demais entidades


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familiares da tutela constitucional ou (b) asseguram tutela dos
efeitos jurídicos no âmbito do direito das obrigações, como se
os integrantes dessas entidades fossem sócios de sociedade de
fato mercantil ou civil.
Cada entidade familiar submete-se a estatuto jurídico próprio,
em virtude de requisitos de constituição e efeitos específicos,
não estando uma equiparada ou condicionada aos requisitos
da outra. Quando a legislação infraconstitucional não cuida de
determinada entidade familiar, ela é regida pelos princípios e
regras constitucionais, pelas regras e princípios gerais do
direito de família aplicáveis e pela contemplação de suas
especificidades. Não pode haver, portanto, regras únicas,
segundo modelos únicos ou preferenciais. O que as unifica é a

função de locus de afetividade e da tutela da realização da


personalidade das pessoas que as integram; em outras
palavras, o lugar dos afetos, da formação social onde se pode
nascer, ser, amadurecer e desenvolver os valores da pessoa.


Não se pode enxergar na Constituição o que ela expressamente
repeliu, isto é, a proteção de tipo ou tipos exclusivos de família ou
da família como valor em si, com desconsideração das pessoas que
a integram. Não há, pois, na Constituição, modelo preferencial de
entidade familiar, do mesmo modo que não há família de fato, pois
contempla o direito à diferença. Quando ela trata de família está a
referir-se a qualquer das entidades possíveis. Se há família, há
tutela constitucional, com idêntica atribuição de dignidade.”
Dessarte, não é possível que o julgador adote posição de inércia, principalmente


considerando que o Direito deve servir de instrumento de pacificação social, independentemente


da opção sexual de cada indivíduo.
Citem-se os seguintes arestos do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
“UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA.
Em renovação de julgamento, após voto de desempate do Min.
Luís Felipe Salomão, a Turma, por maioria, afastou o
impedimento jurídico ao admitir a possibilidade jurídica do pedido
de reconhecimento de união estável entre homossexuais. Assim, o
mérito do pedido deverá ser analisado pela primeira instância, que
irá prosseguir no julgamento anteriormente extinto sem
julgamento de mérito, diante do entendimento da impossibilidade
do pedido. Os Ministros Antônio de Pádua Ribeiro e Massami
Uyeda votaram a favor da possibilidade jurídica do pedido por
entender que a legislação brasileira não traz nenhuma proibição ao
reconhecimento de união estável entre as pessoas do mesmo sexo.
Já os Ministros Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Junior não
reconheciam a possibilidade do pedido por entender que a

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CF/1988 e o CC só consideram união estável a relação entre
homem e mulher com objetivo de formar entidade familiar.
(STJ - REsp nº 820.475 - RJ - Rel. originário Min. Antônio de
Pádua Ribeiro, Rel. para acórdão Min. Luís Felipe Salomão - J.
2.9.2008).”
“DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ADOÇÃO DE MENORES POR
CASAL HOMOSSEXUAL.
SITUAÇÃO JÁ CONSOLIDADA. ESTABILIDADE DA
FAMÍLIA. PRESENÇA DE FORTES VÍNCULOS AFETIVOS
ENTRE OS MENORES E A REQUERENTE.
IMPRESCINDIBILIDADE DA PREVALÊNCIA DOS
INTERESSES DOS MENORES.
RELATÓRIO DA ASSISTENTE SOCIAL FAVORÁVEL AO
PEDIDO. REAIS VANTAGENS PARA OS ADOTANDOS.
ARTIGOS 1º DA LEI 12.010/09 E 43 DO ESTATUTO DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DEFERIMENTO DA
MEDIDA.
1. A questão diz respeito à possibilidade de adoção de crianças por
parte de requerente que vive em união homoafetiva com
companheira que antes já adotara os mesmos filhos, circunstância
a particularizar o caso em julgamento.
2. Em um mundo pós-moderno de velocidade instantânea da
informação, sem fronteiras ou barreiras, sobretudo as culturais e as
relativas aos costumes, onde a sociedade transforma-se
velozmente, a interpretação da lei deve levar em conta, sempre que
possível, os postulados maiores do direito universal.
3. O artigo 1º da Lei 12.010/09 prevê a "garantia do direito à
convivência familiar a todas e crianças e adolescentes". Por sua
vez, o artigo 43 do ECA estabelece que "a adoção será deferida
quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em
motivos legítimos".
4. Mister observar a imprescindibilidade da prevalência dos
interesses dos menores sobre quaisquer outros, até porque está em
jogo o próprio direito de filiação, do qual decorrem as mais
diversas consequencias que refletem por toda a vida de qualquer
indivíduo.
5. A matéria relativa à possibilidade de adoção de menores por
casais homossexuais vincula-se obrigatoriamente à necessidade de
verificar qual é a melhor solução a ser dada para a proteção dos
direitos das crianças, pois são questões indissociáveis entre si.

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6. Os diversos e respeitados estudos especializados sobre o tema,
fundados em fortes bases científicas (realizados na Universidade
de Virgínia, na Universidade de Valência, na Academia
Americana de Pediatria), "não indicam qualquer inconveniente em
que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais
importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio
familiar em que serão inseridas e que as liga a seus cuidadores".
7. Existência de consistente relatório social elaborado por
assistente social favorável ao pedido da requerente, ante a
constatação da estabilidade da família. Acórdão que se posiciona a
favor do pedido, bem como parecer do Ministério Público Federal
pelo acolhimento da tese autoral.
8. É incontroverso que existem fortes vínculos afetivos entre a
recorrida e os menores sendo a afetividade o aspecto
preponderante a ser sopesado numa situação como a que ora se
coloca em julgamento.
9. Se os estudos científicos não sinalizam qualquer prejuízo de
qualquer natureza para as crianças, se elas vêm sendo criadas com
amor e se cabe ao Estado, ao mesmo tempo, assegurar seus
direitos, o deferimento da adoção é medida que se impõe.
10. O Judiciário não pode fechar os olhos para a realidade
fenomênica. Vale dizer, no plano da “realidade”, são ambas, a
requerente e sua companheira, responsáveis pela criação e
educação dos dois infantes, de modo que a elas, solidariamente,
compete a responsabilidade.
11. Não se pode olvidar que se trata de situação fática consolidada,
pois as crianças já chamam as duas mulheres de mães e são
cuidadas por ambas como filhos. Existe dupla maternidade desde o
nascimento das crianças, e não houve qualquer prejuízo em suas
criações.
12. Com o deferimento da adoção, fica preservado o direito de
convívio dos filhos com a requerente no caso de separação ou
falecimento de sua companheira. Asseguram-se os direitos
relativos a alimentos e sucessão, viabilizando-se, ainda, a inclusão
dos adotandos em convênios de saúde da requerente e no ensino
básico e superior, por ela ser professora universitária.
13. A adoção, antes de mais nada, representa um ato de amor,
desprendimento. Quando efetivada com o objetivo de atender aos
interesses do menor, é um gesto de humanidade. Hipótese em que
ainda se foi além, pretendendo-se a adoção de dois menores,
irmãos biológicos, quando, segundo dados do Conselho Nacional
de Justiça, que criou, em 29 de abril de 2008, o Cadastro Nacional

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de Adoção, 86% das pessoas que desejavam adotar limitavam sua
intenção a apenas uma criança.
14. Por qualquer ângulo que se analise a questão, seja em relação à
situação fática consolidada, seja no tocante à expressa previsão
legal de primazia à proteção integral das crianças, chega-se à
conclusão de que, no caso dos autos, há mais do que reais
vantagens para os adotandos, conforme preceitua o artigo 43 do
ECA. Na verdade, ocorrerá verdadeiro prejuízo aos menores caso
não deferida a medida.
15. Recurso especial improvido.
(REsp 889.852/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
QUARTA TURMA, julgado em 27/04/2010, DJe 10/08/2010)”
Recentemente decidiu a Egrégia 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo no julgamento da Apelação Cível n.° 994.09.277.447-1, relatada
pelo Desembargador Natan Zelinschi de Arruda que:
(...) 2. A r. sentença apelada merece ser anulada. A possibilidade
jurídica do pedido envolvendo ação declaratória de
reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo,
cumulada com partilha de bens e herança não tem óbice no
ordenamento jurídico vigente, haja vista que o legislador não
colocou nenhum obstáculo para o reconhecimento de união
homoafetiva. Assim, o disposto no § 3o, do artigo 226 da Magna
Carta, não obstante fazer referência à união estável entre pessoas
de sexo diverso, não restringiu expressamente a entidade familiar
formada por pessoas do mesmo sexo. A jurisprudência assim


entende: "Processo civil Ação declaratória de união homoafetiva.



Princípio da identidade física do juiz. Ofensa não caracterizada
ao artigo 132, do CPC. Possibilidade jurídica do pedido. Artigos
1º da lei 9.278/96 e 1.723 e 1.724 do Código Civil. Alegação de
lacuna legislativa. Possibilidade de emprego da analogia como
método integrativo. (...) 2. O entendimento assente nesta Corte,
quanto à possibilidade jurídica do pedido, corresponde à
inexistência de vedação explícita no ordenamento jurídico para o
ajuizamento da demanda proposta. 3. A despeito da controvérsia
em relação à matéria de fundo, o fato é que, para a hipótese em
apreço, onde se pretende a declaração de união homoafetiva, não
existe vedação legal para o prosseguimento do feito. 4. Os
dispositivos legais limitam-se a estabelecer a possibilidade de
união estável entre homem e mulher, dês que preencham as
condições impostas pela lei, quais sejam, convivência pública,
duradoura e contínua, sem, contudo, proibir a união entre dois
homens ou duas mulheres. Poderia o legislador, caso desejasse,
utilizar expressão restritiva, de modo a impedir que a união entre
pessoas de idêntico sexo ficasse definitivamente excluída da


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abrangência legal. Contudo, assim não procedeu. 5. E possível,
portanto, que o magistrado de primeiro grau entenda existir
lacuna legislativa, uma vez que a matéria, conquanto derive de
situação fática conhecida de todos, ainda não foi expressamente
regulada. 6. Ao julgador é vedado eximir-se de prestar jurisdição
sob o argumento de ausência de previsão legal. Admite-se, se for o
caso, a integração mediante o uso da analogia, a fim de alcançar
casos não expressamente contemplados, mas cuja essência
coincida com outros tratados pelo legislador. 5. Recurso especial



conhecido e provido." (REsp 820.475/RJ. Ministro Luis Felipe
Salomão. Quarta Turma. J. 02-09-2008) "Ação de reconhecimento



e dissolução de sociedade de fato união homoafetiva decisão
saneadora que afastou as preliminares arguidas inépcia da
petição inicial caracterizada, presentes os pressupostos art. 282,
do CPC possibilidade jurídica pedido deduzido pelo autor e
legítimo interesse de agir configurados [legitimidade passiva da
agravada para figurar no pólo passivo da ação que objetiva a
partilha de bens, com reflexos diretos sobre seus direitos
sucessórios cabimento. Decisão mantida. Agravo improvido."


(Agravo de instrumento n.° 575.641-4/9-00. Relator Des. Testa
Marchi. Décima Câmara de Direito Privado. J. 24-03-2009)

"Indeferimento da inicial. Reconhecimento de união estável
homoafetiva. Pedido juridicamente possível. Vara de Família.
Competência. Sentença de extinção afastada. Recurso provido



para determinar o prosseguimento do feito." (Apelação n.°


552.574-4/4-00. Relator Des. Caetano Lagrasta. Oitava Câmara de
Direito Privado. J. 12.03-2008). Por outro lado, a matéria se
apresenta bastante polêmica, inclusive com notório dissídio
jurisprudencial, o que afasta a possibilidade de extinção do
processo por impossibilidade jurídica do pedido, mesmo porque, a
controvérsia sobre o assunto configura, por si só, o necessário para
que a inicial seja recebida e tenha regular seqüência o feito,
incluindo-se no pólo passivo o titular do terreno em que fora
edificada a construção em referência. Desta forma, o
reconhecimento da união homoafetiva pleiteada está apta ao
regular processamento, mesmo porque, o ordenamento jurídico
vigente dá amparo à possibilidade e legalidade de associação entre
pessoas de sexo diferente como para do mesmo sexo, e a omissão
legislativa, em princípio, não pode impedir que a matéria tenha a
decisão correspondente. Por último, a situação fática deve ter a
entrega da prestação jurisdicional no mérito, pois se trata de
matéria que exige o enfrentamento, tanto que inúmeros projetos de
lei abrangendo o tema estão tramitando no Congresso Nacional. 3.
Com base em tais fundamentos, anula-se a sentença para que o
feito tenha regular seqüência. O julgamento teve a participação
dos Desembargadores TEIXEIRA LEITE (Presidente sem voto),
FRANCISCO LOUREIRO e ÊNIO SANTARELLI ZULIANI.
(...)”.

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Por fim, o Colendo Supremo Tribunal Federal assim se posicionou a respeito do
tema conforme notícia veiculada no Informativo nº 625:

Relação homoafetiva e entidade familiar - 1




A norma constante do art. 1.723 do Código Civil CC (“É reconhecida



como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada
na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de



constituição de família”) não obsta que a união de pessoas do mesmo sexo possa


ser reconhecida como entidade familiar apta a merecer proteção estatal. Essa a
conclusão do Plenário ao julgar procedente pedido formulado em duas ações
diretas de inconstitucionalidade ajuizadas, respectivamente, pelo Procurador-
Geral da República e pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro.
Preliminarmente, conheceu-se de argüição de preceito fundamental ADPF,
proposta pelo segundo requerente, como ação direta, tendo em vista a
convergência de objetos entre ambas as ações, de forma que as postulações
deduzidas naquela estariam inseridas nesta, a qual possui regime jurídico mais
amplo. Ademais, na ADPF existiria pleito subsidiário nesse sentido. Em seguida,
declarou-se o prejuízo de pretensão originariamente formulada na ADPF
consistente no uso da técnica da interpretação conforme a Constituição
relativamente aos artigos 19, II e V, e 33 do Estatuto dos Servidores Públicos
Civis da aludida unidade federativa (Decreto-lei 220/75). Consignou-se que,
desde 2007, a legislação fluminense (Lei 5.034/2007, art. 1º) conferira aos
companheiros homoafetivos o reconhecimento jurídico de sua união. Rejeitaramse,
ainda, as preliminares suscitadas.
ADI 4277/DF, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADI-4277)
ADPF 132/RJ, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADPF-132)

Relação homoafetiva e entidade familiar - 2



No mérito, prevaleceu o voto proferido pelo Min. Ayres Britto, relator, que
dava interpretação conforme a Constituição ao art. 1.723 do CC para dele excluir
qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e
duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, entendida esta
como sinônimo perfeito de família. Asseverou que esse reconhecimento deveria
ser feito segundo as mesmas regras e com idênticas conseqüências da união
estável heteroafetiva. De início, enfatizou que a Constituição proibiria, de modo
expresso, o preconceito em razão do sexo ou da natural diferença entre a mulher e
o homem. Além disso, apontou que fatores acidentais ou fortuitos, a exemplo da
origem social, idade, cor da pele e outros, não se caracterizariam como causas de
merecimento ou de desmerecimento intrínseco de quem quer que fosse. Assim,
observou que isso também ocorreria quanto à possibilidade da concreta utilização
da sexualidade. Afirmou, nessa perspectiva, haver um direito constitucional
líquido e certo à isonomia entre homem e mulher: a) de não sofrer discriminação
pelo fato em si da contraposta conformação anátomo-fisiológica; b) de fazer ou
deixar de fazer uso da respectiva sexualidade; e c) de, nas situações de uso
emparceirado da sexualidade, fazê-lo com pessoas adultas do mesmo sexo, ou
não.
ADI 4277/DF, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADI-4277)
ADPF 132/RJ, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADPF-132)

Relação homoafetiva e entidade familiar - 3



Em passo seguinte, assinalou que, no tocante ao tema do emprego da
sexualidade humana, haveria liberdade do mais largo espectro ante silêncio
intencional da Constituição. Apontou que essa total ausência de previsão
normativo-constitucional referente à fruição da preferência sexual, em primeiro
lugar, possibilitaria a incidência da regra de que “tudo aquilo que não estiver

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juridicamente proibido, ou obrigado, está juridicamente permitido”. Em segundo
lugar, o emprego da sexualidade humana diria respeito à intimidade e à vida
privada, as quais seriam direito da personalidade e, por último, dever-se-ia
considerar a âncora normativa do § 1º do art. 5º da CF. Destacou, outrossim, que
essa liberdade para dispor da própria sexualidade inserir-se-ia no rol dos direitos
fundamentais do indivíduo, sendo direta emanação do princípio da dignidade da
pessoa humana e até mesmo cláusula pétrea. Frisou que esse direito de exploração
dos potenciais da própria sexualidade seria exercitável tanto no plano da
intimidade (absenteísmo sexual e onanismo) quanto da privacidade (intercurso
sexual). Asseverou, de outro lado, que o século XXI já se marcaria pela
preponderância da afetividade sobre a biologicidade. Ao levar em conta todos
esses aspectos, indagou se a Constituição sonegaria aos parceiros homoafetivos,
em estado de prolongada ou estabilizada união realidade há muito constatada
empiricamente no plano dos fatos , o mesmo regime jurídico protetivo conferido
aos casais heteroafetivos em idêntica situação.
ADI 4277/DF, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADI-4277)
ADPF 132/RJ, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADPF-132)

Relação homoafetiva e entidade familiar - 4



Após mencionar que a família deveria servir de norte interpretativo para as
figuras jurídicas do casamento civil, da união estável, do planejamento familiar e
da adoção, o relator registrou que a diretriz da formação dessa instituição seria o
não-atrelamento a casais heteroafetivos ou a qualquer formalidade cartorária,
celebração civil ou liturgia religiosa. Realçou que família seria, por natureza ou
no plano dos fatos, vocacionalmente amorosa, parental e protetora dos respectivos
membros, constituindo-se no espaço ideal das mais duradouras, afetivas,
solidárias ou espiritualizadas relações humanas de índole privada, o que a


credenciaria como base da sociedade (CF, art. 226, caput). Desse modo, anotou


que se deveria extrair do sistema a proposição de que a isonomia entre casais
heteroafetivos e pares homoafetivos somente ganharia plenitude de sentido se
desembocasse no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada
família, constituída, em regra, com as mesmas notas factuais da visibilidade,


continuidade e durabilidade (CF, art. 226, § 3º: “Para efeito da proteção do



Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade



familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”). Mencionou,


ainda, as espécies de família constitucionalmente previstas (art. 226, §§ 1º a 4º), a
saber, a constituída pelo casamento e pela união estável, bem como a
monoparental. Arrematou que a solução apresentada daria concreção aos
princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade, da liberdade, da
proteção das minorias, da não-discriminação e outros. O Min. Celso de Mello
destacou que a conseqüência mais expressiva deste julgamento seria a atribuição
de efeito vinculante à obrigatoriedade de reconhecimento como entidade familiar
da união entre pessoas do mesmo sexo.
ADI 4277/DF, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADI-4277)
ADPF 132/RJ, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADPF-132)

Relação homoafetiva e entidade familiar - 5



Por sua vez, os Ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cezar
Peluso, Presidente, embora reputando as pretensões procedentes, assentavam a
existência de lacuna normativa sobre a questão. O primeiro enfatizou que a
relação homoafetiva não configuraria união estável que impõe gêneros
diferentes , mas forma distinta de entidade familiar, não prevista no rol
exemplificativo do art. 226 da CF. Assim, considerou cabível o mecanismo da
integração analógica para que sejam aplicadas às uniões homoafetivas as
prescrições legais relativas às uniões estáveis heterossexuais, excluídas aquelas

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que exijam a diversidade de sexo para o seu exercício, até que o Congresso
Nacional lhe dê tratamento legislativo. O segundo se limitou a reconhecer a
existência dessa união por aplicação analógica ou, na falta de outra possibilidade,
por interpretação extensiva da cláusula constante do texto constitucional (CF, art.
226, § 3º), sem se pronunciar sobre outros desdobramentos. Ao salientar que a
idéia de opção sexual estaria contemplada no exercício do direito de liberdade
(autodesenvolvimento da personalidade), acenou que a ausência de modelo
institucional que permitisse a proteção dos direitos fundamentais em apreço
contribuiria para a discriminação. No ponto, ressaltou que a omissão da Corte
poderia representar agravamento no quadro de desproteção das minorias, as quais
estariam tendo seus direitos lesionados. O Presidente aludiu que a aplicação da
analogia decorreria da similitude factual entre a união estável e a homoafetiva,
contudo, não incidiriam todas as normas concernentes àquela entidade, porque
não se trataria de equiparação. Evidenciou, ainda, que a presente decisão
concitaria a manifestação do Poder Legislativo. Por fim, o Plenário autorizou que
os Ministros decidam monocraticamente os casos idênticos
ADI 4277/DF, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADI-4277)
ADPF 132/RJ, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADPF-132)

Feitas estas considerações, passo a fixar o valor dos danos morais.
Para o arbitramento da indenização, devem ser levados em consideração o
constrangimento sofrido pelos autores, a conduta das partes e a gravidade e conseqüências dos


fatos, buscando a fixação justa do quantum, atentando-se ao caráter preventivo e retributivo, não


podendo servir de fonte para enriquecimento indevido nem insignificante para o ofensor.


José Raffaelli Santini5 leciona que:



“o critério de fixação do dano moral não se faz mediante um
simples cálculo aritmético. O parecer a que se referem é que
sustenta a referida tese. Na verdade, inexistindo critérios previstos
por lei a indenização deve ser entregue ao livre arbítrio do
julgador que, evidentemente, ao apreciar o caso concreto
submetido a exame fará a entrega da prestação jurisdicional de
forma livre e consciente, à luz das provas que forem produzidas.
Verificará as condições das partes, o nível social, o grau de
escolaridade, o prejuízo sofrido pela vítima, a intensidade da
culpa e os demais fatores concorrentes para a fixação do dano,
haja vista que costumeiramente a regra do direito pode se revestir
de flexibilidade para dar a cada um o que é seu.”



Caio Mário da Silva Pereira6 explica que:



“o fundamento da reparabilidade pelo dano moral está em que, a
par do patrimônio em sentido técnico, o indivíduo é titular de
direitos integrantes de sua personalidade, não podendo conformarse
à ordem jurídica em que sejam impunemente atingidos”.



5 SANTINI, José Raffaelli. Dano moral: doutrina, jurisprudência e prática. São Paulo: Editora de Direito,


1996. p. 638.


6 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, CDRom.


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O mesmo autor7 prossegue:



“A vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho
patrimonial efetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em
certos casos pode ser mesmo mais valioso do que os integrantes
de seu patrimônio, deve receber uma soma que lhe compense a
dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às
circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor
e a situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta
em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne
inexpressiva”.



Humberto Theodoro Junior8 obtempera que:



“o juiz, em cujas mãos o sistema jurídico brasileiro deposita a
responsabilidade pela fixação do valor da reparação do dano
moral, deverá fazê-lo de modo impositivo, levando em conta o
binômio 'possibilidades do lesante' - 'condições do lesado',
cotejado sempre com as particularidades circunstanciais do fato
danoso”.


O arbitramento da condenação a título de dano moral deve operar-se com
moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao porte empresarial/pessoal das partes, suas
atividades comerciais e, ainda, o valor do negócio, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos
pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se da experiência e do bom senso,
atento à realidade da vida, notadamente, à situação econômica atual e às peculiaridades do caso
concreto.
O respeito à imagem e a honra das pessoas são inerentes a todos os seres
humanos.
O dano moral coletivo decorreu da evolução do dano moral individual, ainda que
eles apresentem características distintas.
A criação e a aplicação do dano moral coletivo teve, como origem, uma nova
concepção do Direito, ou seja, sob um prisma mais voltado para a esfera social.


Em excelente artigo, a Dra. Selma Pereira de Santana9 de forma bastante


esclarecedora leciona que:

2 - DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR PARTE DO AGRESSOR E A PROVA DO
DANO MORAL COLETIVO
A teoria da responsabilidade objetiva veio simplificar os procedimentos indenizatórios, na
medida em que afastou a necessidade de configuração da culpa e do dolo por parte do
agressor. Carlos Roberto Gonçalves (2003) sustenta que a lei impõe a certas pessoas, em
determinadas situações, a reparação de um dano cometido sem culpa. Quando isso
acontece, diz-se que a responsabilidade é legal ou “objetiva”, porque prescinde da culpa e



7 Responsabilidade Civil. Forense, pág. 67.
8 JÚNIOR, Humberto Theodoro. Dano Moral, Ed. Oliveira Mendes, p. 47.
9 O DANO MORAL COLETIVO E O NOVO PROJETO DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - Selma Pereira De


Santana (Publicada no Juris Síntese nº 94 - MAR/ABR de 2012) Selma Pereira De Santana

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se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade. Essa teoria, chamada de
“objetiva”, ou “do risco”, tem, como postulado, que todo dano é indenizável e deve ser
reparado por quem a ele se liga por um nexo de causalidade, independentemente de culpa.
Enfim, para a caracterização da responsabilidade pelo dano moral coletivo, adotou-se a
responsabilidade objetiva, fazendo com que a sua ocorrência não decorra, exclusivamente,
do dolo ou culpa, mas pela simples existência do dano, bem como o nexo entre o ato ilícito
e o resultado deste. Nesse sentido, Xisto Tiago de Medeiros Neto (2007, p. 144) afirma que
é certo aduzir, portanto, como corolário dos postulados constitucionais da “proteção geral
dos direitos” e da “reparação integral dos danos” (art. 5º, II, V, X, XXXV, da Constituição
da República), que, cuidando-se de dano moral coletivo, não se cogita perquirir-se a
órbita de subjetividade do agente lesante, ou seja, não se faz pertinente buscar a presença
do elemento culpa (lato sensu) para legitimar a reparação devida, haja vista que, repisese,
a responsabilidade incidente, nessa questão, é de natureza objetiva. Assim, o agressor
que vitimar a coletividade em aspectos como: meio ambiente, relações de consumo, de
trabalho, de raça, crença, sexo ou idade, e até de situações da Administração Pública,
poderá ter que indenizar pela simples ocorrência do dano, seja ele decorrente, ou não, de
dolo ou culpa".


O autor citado Xisto Tiago de Medeiros Neto, em sua obra “Dano Moral
Coletivo”, São Paulo: LTr, 2004, p. 136, da mesma forma prossegue:

“A idéia e o reconhecimento do dano moral coletivo (lato sensu), bem como a
necessidade de sua reparação, constituem mais uma evolução nos contínuos
desdobramentos do sistema da responsabilidade civil, significando a ampliação
do dano extrapatrimonial para um conceito não restrito ao mero sofrimento ou à
dor pessoal, porém extensivo a toda modificação desvaliosa do espírito coletivo,
ou seja, a qualquer ofensa a valores fundamentais compartilhados pela
coletividade, e que refletem o alcance da dignidade dos seus membros”.


Além do mais, é suficiente, para que se tenha por comprovada a ocorrência do
dano moral que o magistrado, de maneira prudente e equilibrada, adote o critério do homem médio
para, com base na conclusão extraída dessa atividade, aferir se a conduta perpetrada contra o autor
da ação que busca a reparação pelos danos morais, encontra um grau de reprovabilidade na
sociedade em que ela foi praticada.
Configurados os elementos caracterizadores da obrigação de indenizar, é
fundamental que a quantificação do dano moral guarde consonância com os princípios da
razoabilidade e proporcionalidade, uma vez que o referido instituto, na medida em que não pode
servir de fonte de enriquecimento ilícito para a vítima, igualmente não pode ser tão desprezível a
ponto de encorajar o ofensor a continuar perpetrando atos similares, ressaltando que não pode,
também, levar à penúria o agente agressor, sob pena de, igualmente, configura-se injusto. Deve,
portanto, ser dosado na medida certa: nem mais, nem menos.
Considerando os elementos acima discriminados, estipulo a indenização devida
em R$1.000.000,00, na forma postulada na inicial, eis que valor inferior certamente em nada
puniria a conduta lesiva, sempre com vistas à denominada “Teoria do Desestímulo”.
Como a dor não se mede monetariamente, a importância a ser paga terá de
submeter-se a "um poder discricionário", mas segundo "um prudente arbítrio dos juízes da fixação
do quantum da condenação, arbítrio esse que emana da natureza das coisas". E concluía o douto
Des. AMÍLCAR DE CASTRO: "Causando o dano moral, fica o responsável sujeito às

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conseqüências de seu ato, a primeira das quais será essa de pagar uma soma que for arbitrada,
conforme a gravidade do dano e a fortuna dele, responsável, a critério do Poder Judiciário, como
justa reparação do prejuízo sofrido, e não como fonte de enriquecimento" (Rev. Forense 93/529).
Recomendava, ainda, o mesmo decisório que a condenação fosse ao pagamento do
"que for arbitrado razoavelmente", porque não se trata de "enriquecer um necessitado" nem de
"aumentar a fortuna de um milionário", mas apenas de "impor uma sanção jurídica ao responsável
pelo dano moral causado" (Rev. Forense 93/530).
A reparação do dano moral, segundo AGUIAR DIAS, deve seguir um processo
idôneo, que busque para o ofendido um "equivalente adequado". Lembra, para tanto, a lição de
LACOSTE, segundo a qual não se pretende que a indenização fundada na dor moral "seja sem
limite". Aliás, "a reparação será sempre, sem nenhuma dúvida, inferior ao prejuízo experimentado,
mas, de outra parte, quem atribuísse demasiada importância a esta reparação de ordem inferior se
mostraria mais preocupado com a idéia de lucro do que mesmo com a injúria às suas afeições;
pareceria especular sobre sua dor e seria evidentemente chocante a condenação cuja cifra
favorecesse tal coisa" (apud AGUIAR DIAS, Da Responsabilidade Civil, 9ª ed., Rio, Forense,
1994, vol. II, pág. 740, nota 63).
Em análise recente, feita já à luz da Constituição de 1988, o grande civilista
contemporâneo CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA faz o seguinte balizamento para a fixação
do ressarcimento no caso de dano moral, que, sem dúvida, correspondente à melhor e mais justa
lição sobre o penoso tema: "A vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho
patrimonial efetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em certos casos pode ser mesmo mais
valioso do que os integrantes de seu patrimônio, deve receber uma soma que lhe compense a dor
ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstâncias de cada caso, e tendo em
vista as posses do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em
fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva" (Responsabilidade Civil cit.,
nº 49, pág. 67).
Feitas todas estas considerações e parâmetros, tenho como justo entre as partes a
fixação do dano moral coletivo sofrido em R$1.000.000,00.
Por fim, reputando presentes os requisitos legais autorizadores, entendo que é de
ser deferida a tutela antecipada, como bem ponderou o D. Representante do Ministério Público, a
urgência da medida caracteriza-se diante da demanda social por resposta imediata, pois já foi
constatado o dano, e a morosidade na apresentação de programa compensatório poderia
potencializar as influências negativas, acentuando ainda mais a discriminação perpetrada contra a
sociedade LGBT.


POSTO ISSO e considerando o que mais dos autos consta, JULGO
PROCEDENTE o pedido inicial condeno a requerida ao pagamento do valor de danos morais no


valor de R$1.000.000,00 (um milhão de reais), devidamente corrigidos a partir da presente ocasião
(Súmula 362 do CSTJ) e juros legais a partir do evento danoso (Súmula 54 do CSTJ), que
reverterá para as ações de promoção de igualdade da população LGBT, conforme definição do
Conselho Nacional de Combate à Discriminação LGBT, em analogia ao disposto no § 2º do artigo
13 da Lei 7.347/85, deferindo a tutela antecipada para que os requeridos promovam um programa,
com a mesma duração dos discursos do requerido Levi Fidelix, e na mesma faixa de horário da
programação, que promova os direitos da população LGBT, no prazo de trinta dias a partir da

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publicação da presente sentença, fixando-se multa no valor de R$500.000,00 (quinhentos mil
reais) por cada ato de descumprimento da ordem judicial aqui determinada, extinguindo o
processo com resolução do mérito na forma do artigo 269 inciso I do Código de Processo Civil.
Não há condenação ao pagamento de custas, despesas ou honorários, ausente máfé,


nos termos do art.18 da Lei nº 7.347/8510, aplicável analogicamente ao caso.


Para apreciação do pedido de concessão dos benefícios da assistência judiciária
gratuita e verificação do preenchimento dos requisitos legais, providencie o requerido cópia de sua
última declaração de imposto de renda.
Trago à colação o seguinte aresto do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo,
proferido na Apelação nº 9194839-91.2008.8.26.0000, relatado pelo Desembargador Luiz Antonio
de Godoy:
“De início, observa-se que o pedido de concessão de assistência judiciária gratuita,
formulado pela recorrente, não merece acolhimento. Segundo a consolidada
orientação do Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial, foi reconhecido
que há hipóteses distintas a serem consideradas com relação ao pedido de
assistência judiciária gratuita formulado por pessoa jurídica: ser ou não ela


entidade que objetive lucro. Já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que “a



pessoa jurídica também pode gozar das benesses alusivas à assistência judiciária
gratuita, Lei 1.060/50. Todavia, a concessão deste benefício impõe distinções
entre as pessoas física e jurídica, quais sejam: a) para a pessoa física, basta o
requerimento formulado junto à exordial, ocasião em que a negativa do benefício
fica condicionada à comprovação da assertiva não corresponder à verdade,
mediante provocação do réu. Nesta hipótese, o ônus é da parte contrária provar
que a pessoa física não se encontra em estado de miserabilidade jurídica. Pode,
também, o juiz, na qualidade de Presidente do processo, requerer maiores
esclarecimentos ou até provas, antes da concessão, na hipótese de encontrar-se
em "estado de perplexidade"; b) já a pessoa jurídica, requer uma bipartição, ou
seja, se a mesma não objetivar o lucro (entidades filantrópicas, de assistência
social, etc.), o procedimento se equipara ao da pessoa física, conforme



anteriormente salientado”(Embargos de Divergência no Recurso Especial nº


388.045 RS, Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, v. un., Rel. Min.
Gilson Dipp, em 1º/8/03, DJ de 22/9/03, pág. 252). É certo que o fato de cuidar-se
a apelante de sociedade civil sem fins lucrativos não a faz merecedora do benefício
pleiteado. Ainda que pudesse uma pessoa jurídica ter direito ao benefício da


gratuidade, in casu, não restou demonstrado nos autos achar-se a recorrente em


situação financeira precária. Sem dúvida, a benesse deve ser concedida em termos
comedidos, reservando-se àquelas pessoas jurídicas que, efetivamente, se


encontrem em situação particular de premência de recursos. Aliás, é certo que “O



Superior Tribunal de Justiça pacificou sua jurisprudência no sentido de que 'o
benefício da gratuidade pode ser concedido às pessoas jurídicas apenas se
comprovarem que dele necessitam, independentemente de terem ou não fins



10 Art. 18. Nas ações de que trata esta Lei não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários


periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em
honorários de advogado, custas e despesas processuais.

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lucrativos' (EREsp 1.015.372/SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 1º/7/2009)”


(AgRg no Ag 1341056/PR, 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, v.un., Rel.
Min. Humberto Martins, DJe 09/11/2010), o que, conforme já mencionado, não
ocorreu na presente hipótese.
Por fim, nos termos da Súmula 481 do Colendo Superior Tribunal de Justiça
temos que:

“Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins
lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos
processuais. (Súmula 481, CORTE ESPECIAL, julgado em 28/06/2012, DJe
01/08/2012)”


Oficie-se ao Exmo.Sr.Dr. Desembargador Relator do Agravo de Instrumento nº
2219118-56.2014.8.26.0000 Desembargador Natan Zelinschi de Almeida da Egrégia 4ª Câmara
de Direito Privado, comunicando sobre a prolação da presente sentença.
Dê-se ciência ao Ministério Público.

P.R.I.C.


São Paulo, 13 de março de 2015.

DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE NOS TERMOS DA LEI 11.419/2006,
CONFORME IMPRESSÃO À MARGEM DIREITA
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