STF decide sobre o prazo prescricional do FGTS
Gustavo Filipe Barbosa Garcia
Com o julgado,
deixa de prevalecer o prazo prescricional de 30 anos, que era reconhecido nas
súmulas 362 do TST e 210 do STJ, passando-se a adotar o prazo de cinco.
A prescrição torna inexigível a pretensão relativa
ao direito subjetivo violado, em razão de inércia do seu titular, preservando-se,
assim, a estabilidade e a segurança jurídica nas relações sociais.
A CF, art.
7º, inciso XXIX, dispõe sobre a prescrição a ser aplicada às relações de
trabalho.
Nesse enfoque, a
partir da (ciência da) violação do direito, o trabalhador tem o prazo de cinco
anos para exigir a sua satisfação, por meio do ajuizamento da respectiva
demanda, devendo respeitar, também, o biênio prescricional,
contado da extinção do contrato de trabalho1.
Cabe esclarecer
que a prescrição é instituto de Direito material, embora possa ter aplicação no
processo, por acarretar a resolução do feito com exame do mérito2.
O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, por seu turno, é
atualmente previsto no art. 7º, inciso III, da Constituição Federal de 1988,
como direito dos trabalhadores urbanos e rurais.
A lei 8.036/90, no
art. 23, § 5º, parte final, prevê, especificamente quanto ao FGTS, a
“prescrição trintenária”.
A mesma previsão consta do art.
55 do Regulamento do FGTS, aprovado pelo decreto 99.684/90.
Desse modo, prevalecia o entendimento constante na
Súmula 362 do Tribunal Superior do Trabalho, no sentido de ser “trintenária a
prescrição do direito de reclamar contra o não recolhimento da contribuição
para o FGTS, observado o prazo de 2 (dois) anos após o término do contrato de
trabalho”.
O prazo
prescricional de trinta anos para a cobrança
das contribuições do FGTS também é previsto na súmula 210 do STJ.
Entendia-se,
assim, que o referido art. 23, § 5º, da lei 8.036/90, ao prever prazo
prescricional superior àquele fixado na Constituição da República, não era
inconstitucional, por se tratar de norma mais favorável ao
empregado, que deveria prevalecer em razão do princípio da proteção,
adotado, inclusive, no caput do art. 7º da Constituição.
De todo modo, ainda quanto ao tema, como explicita
a súmula 206 do TST, a “prescrição da pretensão relativa às parcelas
remuneratórias alcança o respectivo recolhimento da contribuição para o FGTS”.
Apesar do acima
exposto, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, em 13 de novembro de 2014, no ARExt 709.212/DF,
com repercussão geral reconhecida, decidiu
que o prazo prescricional aplicável às cobranças dos depósitos do Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço é o previsto no art. 7º, inciso XXIX, da
Constituição da República, por se tratar de direito dos trabalhadores urbanos e
rurais, expressamente arrolado no inciso III do referido dispositivo
constitucional.
Prevaleceu,
assim, o entendimento de ser aplicável ao FGTS o prazo de prescrição de cinco anos, a partir
da lesão do direito (e não apenas o prazo prescricional bienal, a contar da
extinção do contrato de trabalho), tendo em vista, inclusive, a necessidade
de certeza e estabilidade nas relações jurídicas.
Vale dizer, uma vez respeitado o prazo
prescricional de dois anos, que se inicia com o término da relação de emprego,
somente são exigíveis os valores devidos nos últimos cinco anos que antecedem o
ajuizamento da ação.
Com isso,
decidiu-se que o prazo prescricional de
30 anos, previsto no art. 23, § 5º, lei 8.036/90 (e no art. 55 do
Regulamento do FGTS, aprovado pelo decreto 99.684/90), é inconstitucional, por violar o já mencionado art. 7º,
inciso XXIX, da Constituição Federal de 1988.
Ademais, prevaleceu no STF o entendimento de que
não se aplica ao caso o chamado princípio da proteção, por não se tratar de
direito mínimo, que possa ser ampliado por meio de lei ordinária.
Quanto ao tema, a Constituição da República
determinou, de forma expressa e precisa, o prazo prescricional para se exigir a
cobrança dos créditos resultantes das relações de trabalho, como ocorre
justamente quanto ao FGTS, que tem natureza jurídica de direito social e
trabalhista.
Argumentou-se, ainda, conforme voto do relator,
Min. Gilmar Mendes, que “a legislação que disciplina o FGTS criou instrumentos
para que o trabalhador, na vigência do contrato de trabalho, tenha ciência da
realização dos depósitos pelo empregador e possa, direta ou indiretamente,
exigi-los”.
Nesse sentido, o
art. 17 da lei 8.036/90 prevê que os empregadores são obrigados a comunicar
mensalmente aos trabalhadores os valores recolhidos ao FGTS e repassar-lhes todas
as informações sobre suas contas vinculadas recebidas da Caixa Econômica
Federal ou dos bancos depositários. Além disso, a CEF, como agente operador do
FGTS, envia aos trabalhadores, a cada dois meses, extratos atualizados dos
depósitos. O art. 25 da lei 8.036/90 possibilita não apenas ao próprio
trabalhador, seus dependentes e sucessores, mas também ao sindicato a que
estiver vinculado, acionar diretamente a empresa por intermédio da Justiça do
Trabalho, para obrigá-la a efetuar os depósitos das importâncias devidas a
título de FGTS.
Ainda nesse
contexto, a lei 8.844/94, no art. 1º, dispõe ser atribuição do Ministério do
Trabalho e Emprego a fiscalização e a apuração das contribuições ao Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço. O art. 2º do mesmo diploma legal, por seu turno,
prevê que compete à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a inscrição em
Dívida Ativa dos débitos para com o FGTS, bem como a representação judicial e
extrajudicial do FGTS, para a correspondente cobrança, relativamente à
contribuição e às multas e demais encargos devidos.
Concluiu-se, portanto, que “a existência desse
arcabouço normativo e institucional é capaz de oferecer proteção eficaz aos
interesses dos trabalhadores, revelando-se inadequado e desnecessário o esforço
hermenêutico do Tribunal Superior do Trabalho, no sentido da manutenção da
prescrição trintenária do FGTS após o advento da Constituição de 1988” (voto do
Min. Gilmar Mendes).
Ficou decidido,
ainda, ser necessária a mitigação do princípio da nulidade da lei inconstitucional,
com a consequente modulação dos efeitos da referida decisão, atribuindo-lhe
efeitos ex nunc, ou seja, prospectivos, tendo em vista a necessidade de
segurança jurídica, por se tratar de modificação e revisão da jurisprudência
adotada por vários anos no STF (bem como no TST),
com fundamento no art. 27 da lei 9.868/99, aplicável também ao controle difuso de
constitucionalidade.
Desse modo, “para
aqueles [casos] cujo termo inicial da prescrição ocorra após a data do presente
julgamento, aplica-se, desde logo, o prazo de cinco anos. Por outro lado,
para os casos em que o prazo
prescricional já esteja em curso, aplica-se o que ocorrer primeiro: 30 anos,
contados do termo inicial, ou 5 anos, a partir desta decisão. Assim se, na
presente data, já tenham transcorrido 27 anos do prazo prescricional, bastarão
mais 3 anos para que se opere a prescrição, com base na jurisprudência desta
Corte até então vigente. Por outro lado, se na data desta decisão tiverem
decorrido 23 anos do prazo prescricional, ao caso se aplicará o novo prazo de 5
anos, a contar da data do presente julgamento” (STF, Pleno, ARE nº 709.212/DF,
voto, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 13.11.2014).
Em face da relevância do julgado em questão,
transcreve-se a respectiva ementa:
“Recurso extraordinário. Direito do Trabalho. Fundo
de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Cobrança de valores não pagos. Prazo
prescricional. Prescrição quinquenal. Art. 7º, XXIX, da Constituição. Superação
de entendimento anterior sobre prescrição trintenária. Inconstitucionalidade
dos arts. 23, § 5º, da lei 8.036/90 e 55 do Regulamento do FGTS aprovado pelo
decreto 99.684/90. Segurança jurídica. Necessidade de modulação dos efeitos da
decisão. Art. 27 da lei 9.868/99. Declaração de inconstitucionalidade com
efeitos ex nunc. Recurso extraordinário a que se nega provimento.” (STF, Pleno,
ARE nº 709.212/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 13.11.2014).
Como se pode notar, com o importante julgado em
destaque, deixa de prevalecer o prazo prescricional de 30 anos, que era
reconhecido nas súmulas 362 do TST e 210 do STJ, passando-se a adotar o prazo
de cinco anos também quanto ao FGTS.
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