segunda-feira, 16 de novembro de 2015

AMBIÇÃO FAZ PARTE DE NATUREZA HUMANA IMPULSIONA O PROFISSIONAL DE DIREITO

SEGUNDA LEITURA

Ambição faz parte da natureza humana
e impulsiona profissional do Direito

As dificuldades da vida contemporânea, agravadas pela crise econômica e o aumento da concorrência, tornam a realização profissional um sonho mais difícil de ser alcançado do que há 20 ou mais anos.
As barreiras existentes para ingressar ou formar uma banca de advocacia, para ser aprovado em concurso público ou conseguir ser professor de uma Faculdade de Direito, podem levar o jovem profissional ao desalento e a um nocivo conformismo.  O psiquiatra Augusto Cury chama tal estado de ânimo de coitadismo, observando que:
“O coitadismo é o conformismo potencializado, capaz de aprisionar o Eu para que ele não utilize ferramentas para transformar uma história. Vai além do convencimento de que não é capaz, entra na propaganda do sentimento de incapacidade. O coitadista faz marketing de suas crenças irreais, de impotências e limitações. Não tem vergonha de dizer “Sou desafortunado!”, “Sou um derrotado!”, “Nada que faço dá certo!”, “Não tenho solução!”, “Ninguém gosta de mim!”  (O Código da Inteligência, Sextante, p. 50).
O coitadismo acaba sendo uma armadilha, pois leva seu portador à  inanição, termina com sua vontade e ambição. E, de certa forma, acaba sendo aceito com benevolência por terceiros, pois o coitadista, aparentemente, não oferece nenhum grau de risco aos que o rodeiam e, por isso mesmo, desperta  piedade.
Ao inverso, o ambicioso desperta  sentimentos mistos, mais complexos, como admiração, medo e inveja. Afinal, o crescimento do ambicioso poderá exteriorizar o insucesso de quem, dele, está próximo.
Portanto, por essas peculiaridades do ser humano, na área do Direito quem se proclama um coitado, um perseguido pelo destino, é visto com mais simpatia do que quem se propõe a lutar, vencer, conquistar espaços.
Mas qual o resultado de uma ou de outra posição na vida pessoal e profissional da pessoa?
O coitadista pode ser um jovem iniciando sua vida profissional ou um bacharel em Direito com anos de casa. O jovem, depois de tentativas frustradas, pode rebelar-se contra o Exame de Ordem, o mercado de trabalho, os concursos, o sistema de Justiça ou qualquer obstáculo que se interponha entre ele e o sucesso.
Essa posição de vítima poderá resultar solidariedade dos que lhe estão próximos, solidariedade essa nem sempre será sincera. Na verdade, muitos concluirão, sem nada dizer-lhe, obviamente, que ele não é muito esforçado ou que seu Q.I. está bem abaixo do mínimo desejável. Em outras palavras, ao assumir tal posição o sujeito não avançará um passo na busca da realização pessoal.
Vejamos agora a situação de um coitadista mais vivido, com boa experiência profissional na bagagem. Suas queixas poderão atingir alvos diversos. Por exemplo, sendo juiz, poderá lamuriar-se que não é  reconhecido pelo seu Tribunal, não integrou, injustamente, a última lista tríplice de promoção ou que não recebeu apoio financeiro para cursar mestrado. Sendo advogado, poderá viver a lamentar a ingratidão dos clientes ou a demora no julgamento de suas causas.
Por sua vez, a ambição é o sentimento existente no lado oposto, a mola propulsora do mundo. Ela exige vontade,  garra, força física e psicológica. Além disto, estimula a dedicação aos estudos, o aperfeiçoamento profissional, o crescimento cultural em sentido amplo e não apenas no campo do Direito.
O ambicioso, por vezes, é visto com reservas, como se fosse errado querer subir na escala social e econômica. Contudo, não há nada de errado em uma jovem recém-formada querer ter o melhor escritório de advocacia de sua cidade ou de um procurador do Estado almejar ser procurador da República e trabalhar em importantes processos envolvendo políticos e empresários. Da mesma forma, não merece qualquer crítica um desembargador que ambicione ser ministro do STJ ou um advogado consagrado que deseje ser ministro do STF.  São aspirações legítimas.
A ambição tem apenas um risco: tornar-se incontrolável. Aí, sim, ela é nociva. Quem, para alcançar destaque, bajula, corrompe-se, humilha-se perante os que podem ajudá-lo na empreitada, abandona seus ideais sob a justificativa de que não há outro jeito, evidentemente não está utilizando a ambição corretamente. É uma deformação de algo positivo.
Imagine-se um professor que, na busca de uma posição de mando em uma universidade, não hesita em divulgar, através de terceiros, os erros de seu oponente nas redes sociais, prejudicando a imagem do adversário. Ou um procurador de Justiça que, para alcançar a posição de procurador geral da Justiça acerta acordos com os que apoiam sua campanha, garantindo posições corporativas injustificáveis. Ainda, um líder da advocacia que, para alcançar posto de destaque na seccional da OAB, abandona os filhos à própria sorte, perdendo-se em sucessivas viagens para isto ou aquilo.
Nesses casos, a ambição não foi bem dimensionada. Ela deve estar sempre adequada a outros valores importantes, pois de nada valerá alcançar-se um objetivo profissional se nos outros setores de sua vida a pessoa carregar o fardo de fracassos familiares, rejeição pelos amigos ou pela sociedade. De que valerá ser ministro do STF se o filho, graduado em Direito,  passar as tardes no quarto com depressão ou  entregue às drogas? De que adianta ocupar as mais altas posições na hierarquia do Estado e temer ser vaiado em um restaurante?
Em suma, na condução da vida profissional, nada há de errado no fato do profissional do Direito querer ser um vencedor na advocacia ou no serviço público, inclusive alcançando status e boa posição financeira. Ao contrário, Isto é muito mais saudável do que entregar-se ao escapismo, tornar-se um coitadista que dedica seu tempo a atribuir a outros ou ao destino a culpa por seu insucesso. 
No entanto, na busca do êxito é preciso tomar cuidado com a via escolhida, pois a ambição não justifica o abandono de valores como a ética, a honestidade e a solidariedade, sem os quais o sucesso será apenas uma aparência exibida no Facebook, escondendo o sentimento amargo da insatisfação pessoal. Na longa caminhada das profissões jurídicas, cada um faz a sua opção e traça o seu destino.
 é desembargador federal aposentado do TRF da 4ª Região, onde foi corregedor e presidente. Mestre e doutor em Direito pela UFPR, pós-doutor pela Faculdade de Saúde Pública da USP, é professor de Direito Ambiental no mestrado e doutorado da PUC-PR. Presidente eleito da "International Association for Courts Administration - IACA", com sede em Louisville (EUA). É vice-presidente do Ibrajus.
Revista Consultor Jurídico, 15 de novembro de 2015, 8h01

2 comentários:

  1. Essa crônica é o último ato da minha vida profissional. Foi difícil escrevê-la.
    Trabalhei a vida inteira, mas foi no mercado farmacêutico que encerrei minha condição de ativo.
    Amava o que fazia. Era uma atividade dinâmica.
    A competição acirrada.
    Justificava-se tanta garra com a necessidade de tratar do sustento da família.
    Havia, no íntimo, uma mola mais poderosa que me impelia a dedicar-me cada vez mais... Queria , na verdade, ser o melhor, a estrela mais brilhante e ser apontado como o de carreira mais promissora..
    Havia sempre dois ou três que deveriam ser observados, pois eram os que comigo competiam pelo lugar mais alto no podium.
    Não há quem não queira o sucesso e isso não é pecado.
    Colocar o produto no melhor ponto de venda, fazer a operação mais lucrativa e fazer convergir sobre mim os olhos admirados dos superiores.
    Ganhar os prêmios e comissões, chegar em casa e ver o orgulho estampado nos rostos da esposa e dos filhos.
    Quantas noites em claro, lutando para entender o desgraçado do ciclo RAA, uma maldita de uma renina que sob a ação de um angiotensiógino se transforma em uma angiotensina que por sua vez.... Puxa vida!
    E não soubesse não essas desgraceiras para ver...
    Mas era bom chegar nas convenções e ganhar o videocassete ou a televisão ou ainda o prêmio em dinheiro dado ao primeiro colocado nas simuladas médicas.
    Quantas foram as madrugadas nas quais pegava o carro e ia cobrir o setor de trabalho ou para as reuniões de ciclo, nas quais os resultados eram avaliados e os novos objetivos, traçados,
    Toda uma carga de responsabilidade tendo, em muitas ocasiões, deixado o filho no berço queimando de febre ou uma dívida pendente.
    Havia, é verdade, toda uma assessoria auxiliando na preparação do profissional e dando-lhe suporte... quantos momentos foi decisivo o fato dele se bastar.
    Não tinha essa de se tornar celebridade mas, quando o holofote me procurava nos eventos internos da companhia, tudo se ajustava na minha cabeça, as emoções do reconhecimento faziam com que esquecesse todas as agruras.
    A alternância entre os momentos de doçura e os de amargura era tão repentina, que não havia tempo para o prazer ou o sofrer, Mas o pouquinho de prazer que eu consiga se tornava eterno.
    Esquecia o resto...
    De repente, um flash de amargura vem com o quantum de tempo já ido.
    Olha em volta e vê uma garotada ocupando o lugar de contemporâneos na profissão, competidores dignos e já com a camiseta cavada e as havaianas nos pés e pensa:
    _Está chegando a minha hora.
    _ Pai, Vós que Sois amor e bondade, afaste esse cálice de mim.
    Mas Ele não tem nada a ver com isso.
    Tudo é fruto da nossa organização . O Pai será procurado para dar conforto nas horas de amargura, servir de lenitivo.
    De repente e não mais: “ cadê você, cadê você...você passou. Outros repetem as suas jogadas....no vídeo tape do sonho, a história gravou “
    Um dia, levantei-me para fazer a barba para a jornada diária de trabalho, como fazia sempre.
    No espelho, o “ outro “ me disse, quase que sussurrando:
    -Vai dormir seu tonto, você já era.



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  2. Meu Caro José Hamilton Brito.
    Só agora li o seu comentário sobre o tema objeto da postagem acima no meu Blog.
    Fiquei emocionado e preocupado.
    Emocionado, como você cultiva na sua memora tanta coisa que eu considero saudável.
    Não pode ser a sua última crônica.
    Você tem idéias, inspiração e poder de expressão, como poucos.
    Além de considera-lo pessoa maravilhosa, ressalto que você tem uma qualidade pessoal ímpar: capacidade de expressar com clareza, objetividade e concisão.
    O seu texto tem alma.
    Enfim, fiquei preocupado.
    Esse "vídeo tape do sonho" parece que tudo ficou para traz e você não ter inspiração para o futuro, mas tenho recebido ainda poesias e gostaria de receber crônicas outras.
    Falo isso do escritório de advocacia, onde auxilio meus filhos, mas é um trabalho não estressante, porque a esta altura do "campeonato da vida", já fiz o que devida, cumpri minha tarefa sabe!
    Embora poderia continuar a poder fazer mais.
    Um forte abraço.
    Seu amigo e admirado
    José A. Pancotti

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