STJ uniformiza entendimento sobre herança em comunhão parcial de bens
O cônjuge sobrevivente, casado sob o regime da comunhão parcial de bens, concorre com os descendentes na herança do morto apenas em relação aos bens particulares deixados. Com esse entendimento, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça analisou recurso que discutiu a interpretação da parte final do inciso I do artigo 1.829 do Código Civil.
A decisão confirma o Enunciado 270 da III Jornada de Direito Civil, organizada pelo Conselho da Justiça Federal, e pacifica o entendimento entre a 3ª e a 4ª Turma, que julgam matéria dessa natureza.
O enunciado afirma que “o artigo 1.829, I, do CC/02 só assegura ao cônjuge sobrevivente o direito de concorrência com os descendentes do autor da herança quando casados no regime da separação convencional de bens ou, se casados nos regimes da comunhão parcial ou participação final nos aquestos, o falecido possuísse bens particulares, hipóteses em que a concorrência se restringe a tais bens, devendo os bens comuns (meação) serem partilhados exclusivamente entre os descendentes".
Segundo o ministro Raul Araújo, responsável por lavrar o acórdão, o Código Civil modificou a ordem de vocação hereditária, incluindo o cônjuge como herdeiro necessário, passando a concorrer em igualdade de condições com os descendentes do falecido. Embora haja essa prerrogativa, a melhor interpretação da parte final desse artigo sobre o regime de comunhão parcial de bens, segundo o ministro, não pode resultar em situação de descompasso com a que teria o mesmo cônjuge sobrevivente na ausência de bens particulares do morto.
Disputa por terreno
No caso analisado, o autor da ação iniciou relacionamento de união estável em 1981. Em 1988, casou sob o regime de comunhão parcial de bens, quando a mulher já era proprietária de um terreno. Ao longo de 12 anos após o casamento, foi construído no terreno um prédio residencial, com recursos do autor, no montante de R$ 78,6 mil. A mulher morreu em 2008, e o viúvo ajuizou ação para ser reconhecido como proprietário do imóvel, total ou parcialmente.
Os filhos da mulher sustentaram que o imóvel não se comunicava com o cônjuge, pois se trata de bem adquirido anteriormente ao casamento. O Tribunal de Justiça de São Paulo concordou com a tese defendida pelos filhos, mas a 2ª Seção do STJ deu provimento ao recurso do viúvo, que tem mais de 80 anos, reconhecendo o seu direito à meação e à participação como herdeiro necessário dos bens particulares.
Controvérsia
O artigo 1.829, I, do Código Civil dispõe que a sucessão legítima defere-se em uma ordem na qual os descendentes concorrem com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado com o morto no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (artigo 1.640, parágrafo único), ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.
A questão que gerou divergência entre os ministros foi a interpretação da parte final desse artigo, na identificação dos bens em relação aos quais o cônjuge sobrevivente, na qualidade de herdeiro necessário, concorrerá com os descendentes, quando adotado o regime de comunhão parcial de bens.
A controvérsia era saber se a concorrência incidiria sobre todo o conjunto dos bens deixados pelo falecido, chamado de herança; apenas sobre os adquiridos onerosamente na constância do casamento, excluída a meação do cônjuge sobrevivente, a exemplo do que ocorre na sucessão do companheiro (artigo 1.790); ou apenas sobre os bens adquiridos antes do casamento, os quais a lei chama de particulares.
Bens particulares
O relator original do recurso no STJ, ministro Sidnei Beneti (hoje aposentado), apresentou a tese que saiu vencedora na 2ª Seção. Ele entendeu que a concorrência somente se dá em relação a bens particulares, ou seja, em relação àqueles que já integravam o patrimônio exclusivo do cônjuge ao tempo do casamento.
A ministra Nancy Andrighi divergiu desse entendimento. Para ela, o cônjuge sobrevivente, segundo seu direito à meação, concorreria na herança apenas quanto aos bens comuns, havendo ou não bens particulares, que deveriam ser partilhados unicamente entre os descendentes.
Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.